domingo, 22 de junho de 2025

O Último Degrau


Embora o discurso da igualdade de género tenha avançado bastante nas últimas décadas, um fenómeno persiste ainda e desafia a verdadeira equidade. É a dificuldade em promover mulheres ao topo, mesmo quando elas já ocupam posições de liderança logo abaixo.

É comum encontrar mulheres altamente qualificadas, com histórico de resultados e competências reconhecidas, ocupando cargos de gestão sénior, direção ou vice-presidências. No entanto, quando se trata de dar o passo final - assumir a presidência -, o comando de uma área estratégica ou integrar o último nível, a hesitação aparece. Este último degrau transforma-se numa espécie de teto invisível, não mais baseado na falta de mérito, mas em perceções inconscientes e estruturas enrijecidas.

Esta barreira é diferente do conhecido “teto de vidro”, porque ela afeta mulheres, que já romperam muitas das resistências anteriores. Ela manifesta-se subtilmente- são dúvidas sobre o “perfil de liderança”, receios quanto à “exposição”, ou sobre a “capacidade de lidar com pressão”, ou argumentos velados sobre o “momento certo”, raramente usados com a mesma frequência, ou peso, em relação a homens nas mesmas condições.

A dificuldade em promover mulheres ao último degrau não é, na maioria das vezes, declarada. Ela disfarça-se em processos de decisão opacos, e preferências subjetivas pelos modelos tradicionais de liderança e na perpetuação de estereótipos que associam autoridade e poder a figuras masculinas. O resultado é a manutenção de um topo corporativo homogéneo, mesmo diante de um pipeline de talentos femininos prontos para liderar.

Enfrentar esse desafio exige mais do que políticas de diversidade. Requer coragem institucional para rever critérios de promoção, treinar lideranças conscientes e, sobretudo, vontade real de quebrar o ciclo. Porque quando uma mulher está no penúltimo degrau, o que falta não é competência — é decisão.

Acresce, que a política de bastidores que rege muitas promoções no topo das organizações é um obstáculo estrutural. Em ambientes onde decisões são tomadas com base em alianças informais, lealdades pessoais e trocas de favores, o mérito formal — ainda que essencial — não é o critério determinante.

Nesse jogo, acesso e influência importam tanto quanto competência. E é aí que muitas mulheres ficam em desvantagem: não por falta de habilidade política, mas porque esse sistema de favores frequentemente exclui mulheres dos círculos informais de poder — almoços exclusivos, reuniões fora da agenda, espaços onde as decisões são moldadas antes mesmo de qualquer processo oficial.

Além disso, muitas mulheres tendem a evitar (ou são desencorajadas a participar de) redes que operam com lógicas não explícitas, por questões éticas, culturais ou até por receio de serem mal interpretadas. O resultado? Quando chega a hora da escolha, o nome delas simplesmente não está "circulando" nas conversas certas — mesmo que estejam no degrau imediatamente anterior ao topo.

Portanto, não é só o mérito que está em jogo. É a forma como o poder circula. Se as estruturas decisórias continuam baseadas em relações de favor e conveniência, mulheres continuarão sendo preteridas não por falta de capacidade, mas por estarem fora da engrenagem informal que realmente define quem sobe.

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