Embora o discurso da igualdade de género tenha avançado bastante nas últimas décadas, um fenómeno persiste ainda e desafia a verdadeira equidade. É a dificuldade em promover mulheres ao topo, mesmo quando elas já ocupam posições de liderança logo abaixo.
É comum encontrar mulheres altamente
qualificadas, com histórico de resultados e competências reconhecidas, ocupando
cargos de gestão sénior, direção ou vice-presidências. No entanto, quando se
trata de dar o passo final - assumir a presidência -, o comando de uma área
estratégica ou integrar o último nível, a hesitação aparece. Este último degrau
transforma-se numa espécie de teto invisível, não mais baseado na falta de
mérito, mas em perceções inconscientes e estruturas enrijecidas.
Esta barreira é diferente do
conhecido “teto de vidro”, porque ela afeta mulheres, que já romperam muitas
das resistências anteriores. Ela manifesta-se subtilmente- são dúvidas sobre o
“perfil de liderança”, receios quanto à “exposição”, ou sobre a “capacidade de
lidar com pressão”, ou argumentos velados sobre o “momento certo”, raramente
usados com a mesma frequência, ou peso, em relação a homens nas mesmas
condições.
A dificuldade em promover mulheres ao
último degrau não é, na maioria das vezes, declarada. Ela disfarça-se em
processos de decisão opacos, e preferências subjetivas pelos modelos
tradicionais de liderança e na perpetuação de estereótipos que associam
autoridade e poder a figuras masculinas. O resultado é a manutenção de um topo
corporativo homogéneo, mesmo diante de um pipeline de talentos femininos
prontos para liderar.
Enfrentar esse desafio exige mais do
que políticas de diversidade. Requer coragem institucional para rever critérios
de promoção, treinar lideranças conscientes e, sobretudo, vontade real de
quebrar o ciclo. Porque quando uma mulher está no penúltimo degrau, o que falta
não é competência — é decisão.
Acresce, que a política de
bastidores que rege muitas promoções no topo das organizações é um
obstáculo estrutural. Em ambientes onde decisões são tomadas com base em
alianças informais, lealdades pessoais e trocas de favores, o mérito formal —
ainda que essencial — não é o critério determinante.
Nesse jogo, acesso e influência
importam tanto quanto competência. E é aí que muitas mulheres ficam em
desvantagem: não por falta de habilidade política, mas porque esse sistema de
favores frequentemente exclui mulheres dos círculos informais de poder —
almoços exclusivos, reuniões fora da agenda, espaços onde as decisões são
moldadas antes mesmo de qualquer processo oficial.
Além disso, muitas mulheres tendem a
evitar (ou são desencorajadas a participar de) redes que operam com lógicas não
explícitas, por questões éticas, culturais ou até por receio de serem mal
interpretadas. O resultado? Quando chega a hora da escolha, o nome delas
simplesmente não está "circulando" nas conversas certas —
mesmo que estejam no degrau imediatamente anterior ao topo.
Portanto, não é só o mérito que
está em jogo. É a forma como o poder circula. Se as estruturas decisórias
continuam baseadas em relações de favor e conveniência, mulheres continuarão
sendo preteridas não por falta de capacidade, mas por estarem fora da
engrenagem informal que realmente define quem sobe.
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