Análise séria e acutilante, humorada ou entristecida, do Portugal dos nossos dias, da cidadania nacional e do modo como somos governados e conduzidos. Mas também, um local onde se faz o retrato do mundo em que vivemos e que muitos bem gostariam que fosse melhor!
quinta-feira, 31 de outubro de 2024
AMA-SE SEMPRE DA MESMA FORMA?
No começo de uma relação, o amor muitas vezes surge com intensidade, misturando paixão e curiosidade. Esse tipo de amor é frequentemente marcado por uma excitação e um foco na descoberta do outro. Já com o tempo, o amor tende a ganhar outras nuances, como a segurança, a admiração, a parceria, e até uma cumplicidade silenciosa que se fortalece com a convivência.
As diferenças entre um amor apaixonado e um amor maduro, por exemplo, mostram como o sentimento se transforma. Num amor maduro, as expectativas são ajustadas, e existe uma compreensão mais profunda das falhas e vulnerabilidades de cada um. Ama-se sabendo que o outro é humano, com qualidades e defeitos, e que a relação requer trabalho e empatia contínua.
Além disso, ama-se de forma diferente conforme o contexto: o amor familiar, por exemplo, envolve um vínculo que nasce da convivência e do cuidado, enquanto o amor romântico mistura desejo, afeto e conexão emocional. Assim, cada forma de amor tem a sua profundidade e significado. A intensidade de um primeiro amor raramente se repete do mesmo jeito, porque, conforme crescemos, aprendemos a equilibrar o amor com outras partes da vida, como carreira, família e os nossos próprios interesses.
Estas mudanças no modo de amar são uma adaptação natural, uma forma de nos ajustarmos e evoluirmos emocionalmente, aprendendo a amar com mais empatia, compreensão e aceitação e refletem o amadurecimento emocional e a capacidade de ver o outro de maneira mais completa. O amor pode renovar-se reinventar-se, ou, em alguns casos, perder a sua força, mas cada forma traz algo único e revelador sobre quem somos e como estamos dispostos a compartilhar a vida.
OLHOS NOS OLHOS um fenómeno de vendas.
Disponível em todos os hipermercados e livrarias.
quarta-feira, 30 de outubro de 2024
QUE BONITO!
Uma boa parte da minha vida profissional decorreu na Direção Geral da Aeronáutica Civil – então DGAC – então sob o comando do saudoso Eng. Vitor Veres. Foi um tempo que, com ele corri o mundo e aproveitei da sua invulgar cultura, acerca de todos os lugares em que as reuniões decorreram. Devo-lhe muito!
Era casado com a admirável atriz Carmen Dolores, que algumas
vezes nos pôde acompanhar e que eu tive a oportunidade de admirar. Formavam um
casal encantador. Tinham um filho que seguiu os passos paternos.
Há dois dias
recebi, pelo correio, um livro lidíssimo editado com imenso cuidado pela Guerra
e Paz, dedicado a Carmen Dolores por ocasião do seu centenário, de autoria de
Rui Veres, filho de ambos. Emocionei-me imenso, não só pelas dezenas e dezenas
de fotos da artista, como pelo gesto deste filho para com sua mãe.
“O livro
é dedicado a seus Pais bem como a todos os que preservam a lembrança de quem
também foi, nas suas conversas e nos seus livros, uma memorialista empática do
seu tempo. E das efémeras artes do palco.”
Só posso agradecer ao autor e editor, as gratas lembranças que este livro me trouxe. Bem hajam!
segunda-feira, 28 de outubro de 2024
Os anos passam tão depressa e tão devagar
A serendipidade do amor
A serendipidade do amor é o encontro inesperado de algo
precioso, a descoberta de um sentimento ou de uma conexão que surge de forma
surpreendente, sem planeamento. Diferente da busca ansiosa ou da espera
paciente, a serendipidade do amor acontece quando estamos a viver os nossos
próprios caminhos, atentos ao mundo ao nosso redor, mas sem a expectativa
específica de encontrar alguém especial.
Esses encontros parecem ocorrer como que ao acaso: uma pessoa
cruzando a mesma esquina, uma conversa que começa em um contexto qualquer, um
encontro marcado pelo destino. A beleza da serendipidade no amor é que ela
revela o poder do imprevisível e nos lembra que, muitas vezes, os momentos mais
importantes de nossas vidas acontecem sem esforço, como se estivessem
aguardando o momento certo para nos surpreender.
A serendipidade do amor carrega um toque de magia, como se
nos dissesse que, no fundo, algumas coisas são destinadas a acontecer, não
importa o quanto tentemos ou deixemos de tentar. Ela ensina-nos a confiar nos
encontros e desencontros da vida e a perceber que, mesmo sem procurar, podemos
encontrar aquilo de que mais precisamos — um amor, uma amizade, uma inspiração.
domingo, 27 de outubro de 2024
Porque deixamos de amar
Deixar de amar é um processo
íntimo e complexo onde, muitas vezes, o fim do amor não chega como uma rutura
brusca, mas como um desgaste silencioso, uma coleção de pequenos esquecimentos
e silêncios acumulados. É como se o sentimento, antes vivo e vibrante, se fosse
retraindo para um canto mais profundo, um lugar que não alcançamos ou decidimos
ignorar.
Amamos alguém, no começo, pela
forma como nos vemos refletidos naquela relação – a maneira como aquela pessoa
nos faz sentir vivos, únicos, compreendidos. Mas, à medida que o tempo passa,
as mudanças internas, pessoais e muitas vezes invisíveis ao outro, começam a
moldar o nosso sentimento dessa ligação. Passamos a olhar com mais atenção para
as lacunas, para o que antes aceitávamos ou não enxergávamos. E assim, o amor
pode começar a ceder espaço a uma frustração sutil, a uma quietude incómoda.
O amor alimenta-se de pequenas
escolhas diárias, de vulnerabilidades que se renovam, de uma curiosidade pelo
outro que não se esgota. Quando a rotina, o silêncio, ou as dores mal resolvidas
se tornam maiores do que o espaço que damos à curiosidade e ao carinho, o amor
se retrai. Não por uma decisão consciente, mas pelo cúmulo de desencontros,
pela falta de cuidado na escuta, ou pela dificuldade de partilhar aquilo que
nos inquieta.
Às vezes, deixamos de amar quando
já não nos reconhecemos ao lado daquela pessoa ou quando as versões que
construímos para nós mesmos já não encontram repouso naquele abraço. E, outras
vezes, o amor acaba porque falta coragem para reinventá-lo, para fazer
perguntas difíceis ou para ver no outro mais do que apenas a projeção dos
nossos próprios desejos e medos.
O fim do amor é um luto silencioso. Porque mesmo sem brigas, sem grandes eventos que marquem o seu fim, ele deixa um vazio, uma saudade do que foi e do que poderia ter sido. Entender por que deixamos de amar é, na verdade, uma forma de entender por que deixamos de cuidar do vínculo, de priorizar o toque e a palavra, de alimentar o olhar.
sábado, 26 de outubro de 2024
O CORAÇÃO FINGE?
Sim, o coração finge, ou ao menos.
a mente o faz. Esse é um tema fascinante abordado por poetas, filósofos e
psicólogos. Fernando Pessoa, no seu poema “Autopsicografia”, explora-o, ao
dizer que “O poeta é um fingidor / Finge tão completamente / Que chega a
fingir que é dor / A dor que deveras sente”. Ele sugere que o poeta (e, num
sentido mais amplo, todos nós) tende a fingir sentimentos, até ao ponto de nos
convencermos de emoções que talvez nem estejam lá.
No campo da psicologia, o
"fingimento" emocional é, muitas vezes, associado à capacidade de
adaptação. A mente cria defesas e ilusões, em parte para nos proteger. Em
certos momentos, esse fingimento não é uma mentira intencional, mas sim, uma
tentativa de lidar com realidades complexas, sejam elas dolorosas ou incertas.
Um bom exemplo é o autoengano, no qual criamos uma versão mais suportável de
nossas experiências ou sentimentos para evitar desconfortos maiores.
E há, também, o lado social desse
fingimento, quando demonstramos emoções que achamos ser esperadas de nós –
sorrindo quando estamos tristes, ou mostrando tranquilidade quando estamos
ansiosos. Muitas vezes, ao fingir emoções, acabamos “acreditando” nelas, o que
sugere que o fingimento emocional também molda a nossa perceção do que estamos
realmente sentindo.
O coração finge, mas talvez não por maldade. Esse fingimento pode ser uma maneira de sobreviver, de encontrar significados e de, paradoxalmente, ser fiel à própria natureza humana.
O CORAÇÃO
O coração é um mundo secreto,
onde se guardam os mais profundos desejos e as mais íntimas fragilidades. Ele
pulsa de maneira única em cada um de nós, guiando os ritmos dos dias, as
batidas descompassadas dos momentos intensos e a serenidade silenciosa que só o
amor verdadeiro traz.
Às vezes, o coração se fecha,
como uma flor que sente a ameaça do frio, mas em outros momentos se abre
completamente, entregando-se sem reservas. É nele que moram as saudades, os
medos, e as memórias que queremos eternizar. No seu ritmo constante, o coração
guarda segredos que nem sempre temos coragem de revelar, mas que, de alguma
forma, moldam a pessoa que somos e a história que contamos ao mundo.
E quando ele bate mais forte, tudo ao redor ganha novas cores, sentidos e possibilidades. Porque o coração tem essa capacidade quase mágica de transformar o ordinário em extraordinário, de fazer o impossível parecer ao alcance, e de acender faíscas de coragem em meio à escuridão. O coração nos lembra, sempre, que viver plenamente é arriscar-se a sentir de verdade.
sexta-feira, 25 de outubro de 2024
A importância da espiritualidade
A espiritualidade é uma jornada interna, um caminho
silencioso que, embora seja único para cada pessoa, nos aproxima de uma verdade
universal. No meio da correria da vida, o mundo muitas vezes, pede-nos para
olhar apenas para fora — para os nossos feitos, para as nossas conquistas, para
as expectativas dos outros. No entanto, a espiritualidade convida-nos a voltar
o olhar para dentro, onde habitam as questões mais profundas sobre quem somos e
o que realmente importa.
Ao conectarmo-nos com a espiritualidade, tocamos o invisível
e nos abrimos ao que há de mais essencial em nós. Ela nos faz lembrar de que
somos mais que corpos em movimento, pensamentos e emoções. Ela chama-nos a
ouvir a voz sutil da alma, que sempre sussurra verdades, mesmo no meio do
barulho do mundo. Esta conexão não precisa de rituais grandiosos ou dogmas
rígidos; muitas vezes, ela manifesta-se na simplicidade de um pôr do sol, no
silêncio de uma manhã calma ou na sensação de plenitude por estar presente num
momento especial.
A espiritualidade, quando genuína, ajuda-nos a ver a
interconexão entre tudo. Ensina-nos que não estamos isolados, mas que fazemos
parte de um grande tecido de vida, onde cada ser e cada experiência tem um
propósito. Essa compreensão desperta em nós a compaixão, a empatia e a
gratidão, qualidades que trazem paz ao
nosso interior e harmonia às nossas relações. Ela nos ensina a aceitar a
impermanência, reconhecendo a beleza até nos momentos difíceis, sabendo que
tudo faz parte de um ciclo maior.
Assim, a espiritualidade ajuda-nos a cultivar um espaço
sagrado dentro de nós, um refúgio onde encontramos consolo, força e propósito.
Mais do que crença, é um estado de ser, um modo de estar no mundo que nos
permite viver com mais leveza e sentido, em sintonia com o que realmente nos alimenta
o coração e a alma.
No fundo, a espiritualidade é um convite para sermos inteiros — e, talvez, essa seja a maior de todas as conquistas.
quinta-feira, 24 de outubro de 2024
ENGANOS OU ERROS?
O tema "enganos ou
erros" envolve tanto aspetos intencionais quanto não intencionais do
comportamento humano. Um engano é geralmente associado à intenção deliberada de
induzir outra pessoa ao erro, ou seja, é um ato de manipulação, falsidade ou
fraude. Já o erro, por outro lado, refere-se a um equívoco ou falha cometida
sem má intenção, resultando de um entendimento incorreto ou de falta de
conhecimento.
Enganos são atos que envolvem
desonestidade, distorção da verdade ou a criação de uma falsa perceção da
realidade. A pessoa que engana sabe que está mentindo e, frequentemente, fá-lo
para obter algum benefício próprio, seja financeiro, social ou emocional.
Exemplos disso incluem fraudes financeiras, manipulação emocional ou propaganda
enganosa.
Por outro lado, os erros são
falhas que ocorrem num processo de tomada de decisão ou ação, sem a intenção de
causar dano. Erros são comuns e fazem parte da aprendizagem humana. Eles podem
ser causados por desinformação, falhas de julgamento, mal-entendidos ou até
mesmo simples distração. Por exemplo, um erro de cálculo numa conta ou a
interpretação incorreta de uma instrução são considerados erros genuínos.
Apesar dessas diferenças, tanto
enganos quanto erros podem gerar consequências sérias. Um erro não intencional
pode causar grandes prejuízos, assim como um engano deliberado. No entanto, a
forma como a sociedade lida com cada um é distinta. Enganos geralmente são
vistos com maior rigor moral, enquanto erros são tratados com uma perspetiva
mais educacional ou corretiva, levando em conta a possibilidade de aprendizado
e evolução.
Portanto, ao abordar "enganos ou erros", é importante entender as intenções por trás de cada ação. Erros oferecem oportunidade de melhoria e crescimento pessoal, enquanto enganos desafiam os princípios de confiança e honestidade nas relações humanas.
quarta-feira, 23 de outubro de 2024
Como nos olhamos anos depois
Anos depois, olhamo-nos
com uma mistura de estranheza e de familiaridade. Enxergamos a versão de nós
mesmos que existia num tempo distante, quase como se fôssemos duas pessoas diferentes.
Aquelas escolhas, os medos e as certezas que pareciam tão inabaláveis agora
parecem quase ingênuos ou desnecessários. O que um dia foi essencial talvez
tenha perdido o peso, e o que parecia insignificante agora carrega um valor
profundo.
Vemos os sonhos
que tivemos — alguns realizados, outros deixados pelo caminho — e nos
perguntamos como nos deixamos ser moldados pelas circunstâncias, pelas
mudanças, pelas surpresas da vida. Aquela versão antiga de nós, cheia de
vontades e esperanças, ainda vive em algum lugar dentro de nós, mesmo que um
pouco desgastada pelo tempo.
Com o passar
dos anos, aprendemos a olhar para nós mesmos com mais compaixão. O que antes
era motivo de arrependimento ou crítica, agora pode ser visto com uma dose de
compreensão. A pessoa que éramos fez o melhor que podia, com o que sabia e com
o que tinha. E hoje, enquanto olhamos para trás, entendemos que não chegamos
aqui apesar do que éramos, mas por causa disso.
Há uma certa doçura em perceber que a jornada nos moldou de formas que nem imaginávamos. E, embora o reflexo de quem fomos não seja mais o mesmo no espelho, ele ainda nos pertence. É uma lembrança viva de tudo o que vivemos, amamos, perdemos e aprendemos.
terça-feira, 22 de outubro de 2024
A simplicidade
A simplicidade como forma de
vida é um conceito que busca a essência do que é realmente necessário,
eliminando o excesso e focando-nos no que traz mais valor e bem-estar. Viver de
maneira simples não significa renunciar a tudo ou viver com menos do que se
precisa, mas sim fazer escolhas conscientes, que promovam o equilíbrio, paz
interior e uma conexão mais profunda com o presente e com o que realmente
importa. Exemplifico.
Desapego do material: O
consumismo exacerbado pode levar-nos a acumular bens e objetos que, com o
tempo, não trazem satisfação real. A simplicidade incentiva o desapego, a posse
consciente e o uso de apenas aquilo que é necessário ou significativo.
Minimalismo mental:
Viver com simplicidade também envolve manter a mente mais clara, livre de
preocupações desnecessárias e distrações. Isso pode ser alcançado por meio de
práticas como a meditação, mindfulness ou até mesmo simplificando a forma como
lidamos com desafios e decisões diárias.
Valorização das
experiências: A simplicidade leva-nos a dar mais valor às experiências e
aos relacionamentos do que aos objetos. A felicidade vem mais das relações
humanas, da natureza e do tempo de qualidade, do que das conquistas materiais.
Tempo e rotina: Ao
simplificar compromissos e rotinas, é possível dedicar mais tempo a atividades
que realmente importam. Isso significa aprender a dizer "não" a
coisas que nos afastam dos nossos valores e objetivos, gerindo o tempo de forma
mais sábia.
Sustentabilidade e
consciência ambiental: Viver de forma simples também está ligado a um
estilo de vida mais sustentável, consumindo de forma responsável, evitando
desperdícios e cuidando dos recursos naturais.
Autossuficiência: A
simplicidade está ligada à ideia de depender menos do externo, seja
financeiramente ou emocionalmente. Aprender a fazer coisas por si mesmo, como
cultivar alimentos, reparar objetos ou desenvolver habilidades, é uma forma de
se reconectar com a autonomia e reduzir a necessidade de consumo excessivo.
Este estilo de vida não é uma moda passageira, mas uma forma de alcançar uma vida mais plena, equilibrada e autêntica, que prioriza o essencial e elimina o superficial.
segunda-feira, 21 de outubro de 2024
Haverá hoje uma ditadura da juventude?
A ideia de uma "ditadura da
juventude" sugere que os jovens estão a exercer uma influência
desproporcional ou autoritária sobre a sociedade, impondo os seus valores,
comportamentos e preferências. Esse conceito pode ser interpretado de várias
maneiras, dependendo do contexto. Hoje, há algumas tendências que podem levar a
essa perceção.
- Cultura digital e redes sociais: Os jovens
dominam as plataformas digitais e as redes sociais, que são espaços onde
se moldam grande parte das discussões públicas, tendências culturais e até
mesmo influências políticas. Isso dá aos jovens um poder significativo
para influenciar a opinião pública e moldar comportamentos.
- Transformações culturais: Movimentos sociais
contemporâneos, como os relacionados ao ambientalismo, igualdade de género,
direitos LGBTQ+, entre outros, são frequentemente liderados e energizados
por jovens. Isso pode ser visto como uma forma de as novas gerações
desafiarem e, por vezes, substituírem os valores tradicionais.
- Cultura do cancelamento: A chamada
"cultura do cancelamento" é frequentemente associada a jovens,
que usam as redes sociais para responsabilizar figuras públicas por
comportamentos ou discursos considerados problemáticos. Críticos dessa
cultura podem ver isso como uma forma de pressão autoritária para
conformidade.
- Mercado e cultura pop: A indústria da
música, moda, entretenimento e tecnologia é fortemente moldada por gostos
e comportamentos de jovens, o que pode dar a impressão de que os valores e
preferências da juventude dominam o mercado e a sociedade como um todo.
Contudo, chamar a isto de "ditadura" pode ser um exagero, já que a sociedade continua a ser influenciada por diferentes grupos etários, económicos e culturais. As transformações que vemos podem ser parte de um ciclo natural, no qual cada geração faz valer as suas ideias, assim como ocorreu com as gerações passadas.
domingo, 20 de outubro de 2024
O PASSADO
Anos depois, olhamo-nos com uma mistura de estranheza e de
familiaridade. Enxergamos a versão de nós mesmos que existia num tempo
distante, quase como se fôssemos duas pessoas diferentes. Aquelas escolhas, os
medos e as certezas que pareciam tão inabaláveis, agora parecem quase ingénuos
ou desnecessários. O que, um dia, foi essencial, talvez tenha perdido peso, e o
que parecia insignificante, agora carregue um valor profundo.
Vemos os sonhos que tivemos — alguns realizados, outros
deixados pelo caminho — e perguntamo-nos como nos deixámos ser moldados pelas
circunstâncias, pelas mudanças, pelas surpresas da vida. Aquela nossa versão antiga,
cheia de vontades e esperanças, ainda vive em algum lugar dentro de nós, mesmo
que um pouco desgastada pelo tempo.
Com o passar dos anos, aprendemos a olhar para nós mesmos com
mais compaixão. O que antes era motivo de arrependimento ou crítica, agora pode
ser visto com uma certa dose de compreensão. A pessoa que éramos fez o melhor
que podia, com o que sabia e com o que tinha. E hoje, enquanto olhamos para
trás, entendemos que não chegámos aqui, apesar do que éramos, mas por causa
disso.
Há uma certa doçura em perceber que a jornada nos moldou de formas que nem imaginávamos. E, embora o reflexo de quem fomos, não seja mais o mesmo no espelho, ele ainda nos pertence. É uma lembrança viva de tudo o que vivemos, amámos, perdemos e aprendemos.
sábado, 19 de outubro de 2024
OUTONO
O outono, para mim, traz sempre uma
sensação de introspeção e renovação. É aquela época do ano em que tudo parece
desacelerar, como se a natureza se estivesse a preparar para uma pausa. O ar
fica mais fresco, e as manhãs ganham um toque de neblina, dando uma beleza
melancólica ao dia a dia. Gosto de caminhar pelas ruas cobertas de folhas
secas, sentindo aquele aroma terroso que só o outono tem, e ouvindo o som das
folhas quebrando-se sob os meus pés.
Há algo de muito reconfortante
nesta estação. Talvez seja o contraste com a vivacidade do verão que a antecede
— o outono parece convidar-nos a ficar mais quietos, mais presentes no momento.
Adoro quando o vento começa a trazer um friozinho que pede por casacos mais
quentes, e também pelas primeiras chávenas de chá ou café quentes da temporada,
que aquecem as mãos e o espírito.
Para mim, o outono é como uma pausa, um momento para refletir. As folhas caindo lembram-me que é preciso deixar algumas coisas irem embora, assim como a natureza faz, para que o novo possa surgir. É um tempo para estar mais em casa, não só no sentido físico, mas dentro de mim mesmo, religando-me com o que é essencial
sexta-feira, 18 de outubro de 2024
Nada é para sempre
Há uma melancolia silenciosa na ideia de que nada é para
sempre. Às vezes, isso nos pesa, como se tudo o que amamos pudesse escorrer por
entre os nossos dedos, sem aviso. Outras vezes, parece libertador, como se as
dores, as feridas, as ausências, também tivessem um prazo de validade. Nada
permanece do jeito que conhecemos — nem nós, nem o mundo ao redor.
Os momentos que parecem eternos — um sorriso, um olhar que
diz mais do que mil palavras, aquele abraço que traz aconchego — um dia vão se
dissipar no ar. As pessoas que amamos podem partir, perder-se, seguir por
caminhos que não cruzam mais os nossos. E nós, presos ao inevitável fluxo do
tempo, seguimos como andarilhos, tentando segurar pedaços do que já foi.
Mas talvez haja beleza nisso. Talvez a efemeridade seja o que
dá valor ao que vivemos. Talvez seja o fim iminente que torna o presente tão
precioso. É no breve que se aninha a intensidade; é no efêmero que o
extraordinário surge, sutil, mas marcante.
Se nada é para sempre, então cada segundo é único. As
despedidas ganham uma profundidade que só o fugaz permite. As chegadas tornam-se
celebrações do reencontro, sabendo que podem ser as últimas, e cada instante ao
lado de quem amamos vira um presente que não se repete.
Há uma suavidade na aceitação de que a vida é um contínuo
movimento de chegadas e partidas. Nada dura, mas, paradoxalmente, é isso que
deixa cada pequena eternidade gravada em nós. O que vivemos não se apaga — se
transforma. E, mesmo que o tempo passe, levando com ele tudo o que achamos que
temos, a verdade é que nada se perde por completo.
Nada é para sempre. Mas, enquanto dura, é tudo o que temos. E talvez seja isso que torne a vida, por mais breve que seja, tão cheia de significado.
quinta-feira, 17 de outubro de 2024
FINGIR
Fingir é algo que muita gente faz, e geralmente se deve a
razões de medo ou de insegurança. Pode ser por não se querer mostrar uma
fraqueza, por medo de não ser aceite ou até por se tentar proteger de situações
desconfortáveis. Às vezes, as pessoas fingem para se encaixar, para parecerem
mais fortes, ou porque sentem que, se mostrarem quem realmente são, vão acabar
magoadas ou rejeitadas.
Penso que, no fundo, todo mundo já fingiu em algum momento da
vida. Pode ser uma risada que se força numa conversa pouco importante, ou
fingir que está tudo bem quando, na verdade, se está desmoronando por dentro. É
uma maneira de lidar com as pressões diárias — das expectativas sociais, do
medo do julgamento, das responsabilidades que nós carregamos.
Mas fingir o tempo todo pode ser exaustivo. Vamo-nos
afastando de quem realmente somos, porque se está sempre tentando agradar ou
adaptar ao que os outros esperam de nós. E isso pode fazer com que nos sentamos
desconectados, perdidos, porque, no fim das contas, ninguém está realmente
vendo quem somos de verdade.
Então, no fundo, nós fingimos para nos protegermos, para evitar que vejam as nossas vulnerabilidades. Mas é um hábito perigoso. Quanto mais se finge, mais difícil fica ser autêntico e se aceitar como somos. E, às vezes, as pessoas que mais importam na nossa vida querem conhecer a nossa versão real, não a que inventamos para nos sentirmos mais seguros.
quarta-feira, 16 de outubro de 2024
Quem comanda as minhas emoções
As emoções são geradas e
influenciadas por vários fatores, mas quem "comanda" minhas emoções,
em grande parte, sou eu. Embora as emoções sejam reações naturais a situações e
estímulos externos, cada um tem o poder de geri-las e moldá-las com o tempo.
Vamos explorar isto mais a fundo.
- Respostas automáticas: Emoções como medo,
raiva, tristeza e alegria são respostas automáticas do cérebro a
diferentes estímulos. Elas surgem sem muito controle consciente, como uma
forma de proteção ou de sinalizar algo importante.
- Influência do cérebro: Regiões como o sistema
límbico, que inclui a amígdala e o hipocampo, desempenham um papel
central na geração das emoções. Essas áreas reagem rapidamente a eventos,
muitas vezes antes mesmo de a mente consciente processar completamente a
situação.
- Autoconsciência emocional: A chave para
"comandar" as nossas
emoções está no desenvolvimento da inteligência emocional, que
envolve:
- Reconhecer as nossas emoções: Ser capaz de
identificar como você se sente.
- Entender a causa das emoções: Perceber o
que está gerando determinada emoção.
- Regulá-las conscientemente: Usar
estratégias como respiração, reflexão ou mudança de perspetiva para gerir
a intensidade das emoções.
- Influências externas: as nossas emoções
também podem ser influenciadas por outras pessoas, pelo ambiente e até
pela nossa saúde física. No entanto, ao praticar a autoconsciência e
trabalhar no controle emocional, é possível diminuir a influência desses
fatores externos.
Portanto, embora as emoções possam surgir sem controle consciente, a pessoa tem o poder de decidir como reagir a elas e, com a prática, regular como essas emoções afetam a nossa vida.
OLHOS NOS OLHOS
Olhos nos Olhos é uma expressão que carrega um forte simbolismo relacionado com
a conexão direta e intensa entre duas pessoas. Quando falamos de "olhos
nos olhos", normalmente estamos a referir-nos a um momento de honestidade,
verdade e, muitas vezes, de confrontação. Olhar nos olhos de alguém significa
encarar a outra pessoa sem disfarces ou fugas, permitindo uma comunicação mais
profunda, na qual as palavras podem ser desnecessárias, já que o olhar por si
só transmite sentimentos e intenções.
Esta expressão também nos remete à vulnerabilidade, já que
quando olhamos diretamente nos olhos de alguém, expomos parte de nós próprios.
É um gesto que exige coragem, especialmente em situações emocionais delicadas,
como declarações de amor, discussões ou pedidos de desculpas. O contato visual
carrega significados universais: confiança, sinceridade e intimidade. Muitas
vezes, ele é, mesmo, a forma mais poderosa de se conectar com o outro, porque o
olhar tem a capacidade de revelar o que está escondido por trás das palavras.
Na arte e na música, "Olhos nos Olhos" pode ser
explorado como tema para tratar de relações humanas, tanto no amor quanto nos
conflitos. Um exemplo famoso é a canção de Chico Buarque, em que a expressão é
usada para falar sobre o fim de um relacionamento e a difícil tarefa de encarar
o outro, agora numa nova realidade, a da separação. A ideia de enfrentar a
verdade, seja ela qual for, está profundamente atrelada ao conceito de
"olhos nos olhos".
O meu livro "Olhos nos Olhos" , que hoje vai para as livrarias, simboliza, assim, o encontro com a verdade e a essência de uma relação. É um convite ao diálogo, sincero, onde as emoções são expostas de maneira crua, e os olhares se tornam a principal linguagem entre duas almas.
terça-feira, 15 de outubro de 2024
O instante depois do beijo
Li hoje um texto de Mia Couto. Intitulado o “Instante antes
do beijo”. A expressão ficou na minha cabeça e eu resolvi escrever sobre o
“depois”. Aqui fica.
"O instante depois do beijo" é um momento carregado
de emoções e significados, que pode variar consoante o contexto e os
personagens envolvidos. Pode representar um instante de magia, confusão,
expectativa ou até mesmo alívio. É um momento de suspensão, onde o tempo parece
desacelerar e as emoções se tornam intensas.
Nesse instante, muitos sentimentos podem estar presentes:
surpresa, conexão, nervosismo, ansiedade, desejo, ou mesmo uma sensação de
completude. O beijo, geralmente visto como um clímax de tensão entre duas
pessoas, abre as portas para um novo capítulo — seja ele de amor ou de
incerteza. Esse momento é marcado pelo olhar trocado logo após o beijo, pelas
respirações aceleradas, pelo toque que talvez se mantenha ou se afaste.
Visualmente, o "instante depois do beijo"
pode ser descrito como um cenário íntimo, onde os dois protagonistas se
encontram próximos, os rostos ainda perto um do outro, e o mundo em volta
parece momentaneamente desaparecer, deixando apenas os dois e a intensidade
daquele breve segundo de silêncio e emoções não ditas
segunda-feira, 14 de outubro de 2024
A necessidade de reformar mentalidades
A frase "A necessidade de
reformar mentalidades" sugere que, em determinados contextos, é crucial
mudar a forma como as pessoas pensam, agem e se relacionam com determinadas
questões. Essa reforma de mentalidades envolve a transformação de crenças,
valores e atitudes que podem estar ultrapassados, limitadores ou prejudiciais
ao desenvolvimento de uma sociedade mais justa, igualitária e aberta ao
diálogo.
Essa necessidade de mudança
mental pode estar ligada a diferentes áreas. Saliento as que para mim são mais
importantes.
- Educação: A reforma de mentalidades na
educação pode significar a adoção de uma visão mais inclusiva, crítica e
participativa, que vai além da mera transmissão de conteúdo, preparando os
cidadãos para refletir e agir de forma autónoma.
- Preconceitos e discriminação: Combater
racismo, machismo, homofobia e outras formas de opressão, exige uma
transformação cultural profunda, onde as mentalidades preconceituosas
precisam ser questionadas e superadas.
- Sustentabilidade: A mudança de mentalidades
no que diz respeito ao meio ambiente é necessária para que se adote uma
postura mais consciente e responsável em relação ao uso de recursos
naturais, consumo e impacto ambiental.
- Economia e trabalho: Reformar a forma de
pensar sobre trabalho, sucesso e produtividade pode levar a novas formas
de organizar o tempo, de valorizar o bem-estar e de reconhecer a
importância da colaboração e da inovação no desenvolvimento económico.
Estas transformações exigem tempo, paciência e, muitas vezes, enfrentam resistência, já que mudar hábitos e crenças profundamente enraizadas não é algo fácil. No entanto, a reforma de mentalidades é fundamental para enfrentar os desafios do presente e construir um futuro mais justo e sustentável.
sábado, 12 de outubro de 2024
Women on Boards: A Força e o Prazer de Ser Mulher
A VdA Academia organizou o 12º
programa Women on Boards. A sua Presidente, Dra Margarida Couto convidou-me
para fazer a sessão de abertura. Aqui fica o que lá disse.
Ser mulher é uma experiência
poderosa, marcada por resiliência, força e, acima de tudo, pelo prazer de
construir histórias de sucesso em múltiplas frentes. As conquistas femininas ao
longo da história revelam a capacidade única de equilibrar sonhos pessoais com
realizações profissionais, desafiando as barreiras impostas e conquistando cada
vitória com orgulho e determinação.
É com essa inspiração que
surge o Women on Boards, um espaço que celebra e fomenta o protagonismo
feminino no ambiente corporativo, abrindo portas e criando novas oportunidades
para que mais mulheres ocupem posições de liderança e tomem assento nas mesas
onde as grandes decisões são tomadas. Compreendemos que cada mulher traz
consigo uma bagagem rica de experiências, e ao ocupar esses espaços, ela não só
se eleva a si mesma, mas transforma o ambiente ao seu redor.
O prazer de ser mulher vai
além das conquistas individuais. Está em cada passo dado em direção a um futuro
mais igualitário, onde a pluralidade de vozes femininas enriquece o diálogo e
molda organizações mais inclusivas e inovadoras. É na força coletiva que
encontramos o verdadeiro prazer de ser mulher — em saber que a vitória de uma é
a vitória de todas.
O Women on Boards acredita
nesse potencial transformador. E existe para apoiar e celebrar cada trajetória,
fortalecendo redes de apoio, encorajando o crescimento e reafirmando que as
mulheres não estão apenas prontas para liderar, elas já estão liderando.
Juntas, são o reflexo do
prazer e da força de ser mulher. Cada vitória no mundo corporativo não é apenas
um marco individual, mas um símbolo de que estamos no caminho certo para a
verdadeira igualdade e para um futuro onde o sucesso feminino será regra, e não
exceção.
O prazer e a força de ser mulher está profundamente ligado às vitórias coletivas e individuais, especialmente em ambiente corporativo, o que reflete a missão das Women on Board de impulsionar o papel das mulheres em cargos de liderança.
sexta-feira, 11 de outubro de 2024
O REPÚDIO
O repúdio é uma forma forte e enfática de rejeição,
manifestada por pessoas, grupos ou sociedades diante de comportamentos,
atitudes ou ações consideradas inadequadas, imorais ou ofensivas. Expressar
repúdio vai além da simples discordância; trata-se de um posicionamento claro e
contundente contra algo que fere valores éticos, sociais, culturais ou
pessoais.
Esse sentimento de rejeição pode ser percebido em diferentes
contextos, como na política, quando a população ou uma parte dela manifesta
repúdio a governantes ou políticas públicas que julgam injustas; ou no campo
das relações humanas, quando ações discriminatórias, preconceituosas ou
violentas são rechaçadas pela sociedade.
O repúdio também se faz presente no campo da moralidade e da
ética. Por exemplo, atos de corrupção, violação de direitos humanos, racismo,
homofobia, violência doméstica e outras práticas danosas à convivência pacífica
e à justiça social são alvos frequentes de manifestações de repúdio. Quando a
sociedade se une para repudiar determinado comportamento, ela sinaliza a
necessidade de mudança e de construção de um ambiente mais justo e inclusivo.
Em termos legais, o repúdio pode ser formalizado por meio de
declarações, moções ou atos oficiais, como protestos ou abaixo-assinados, em
que grupos exigem responsabilização e mudanças. É, portanto, um instrumento de
pressão social, um reflexo da insatisfação coletiva que busca a correção de
injustiças e a defesa de princípios considerados fundamentais para a
convivência humana.
Assim, o repúdio serve como um alerta, uma resistência ao que é percebido como prejudicial ou inaceitável, e um apelo por transformações necessárias na sociedade.
quinta-feira, 10 de outubro de 2024
O SAL DA VIDA
"O Sal da Vida" é aquele elemento essencial que dá
sabor às coisas simples e intensifica o que, de outra forma, seria apenas
quotidiano. E o que torna os momentos comuns extraordinários, o tempero
invisível que transforma a vida em algo maior do que a soma dos dias que
passam. Ele não se revela nos grandes feitos ou nos eventos grandiosos, mas nos
detalhes sutis do abraço apertado de um amigo, do sol morno na pele durante uma
caminhada despretensiosa, da risada que escapa sem aviso.
É aquele olhar compartilhado em silêncio com quem amamos, que
diz mais do que as palavras poderiam, ou o conforto inesperado de um cheiro
familiar que nos transporta para uma memória querida. O sal da vida está nas
pequenas alegrias, naquilo que muitas vezes deixamos passar, mas que, quando
percebido, enche o coração de uma gratidão quase palpável.
Talvez seja uma música que toca na rádio e faz o mundo
parecer mais leve, ou a simplicidade de uma tarde em que o tempo parece
desacelerar, permitindo que possamos respirar e apenas ser. O sal da vida está
nas pausas, nos interstícios do viver, nos momentos em que nos sentimos mais
conectados com nós mesmos e com os outros.
Não são as conquistas que acumulamos, mas as emoções que
experimentamos, as pessoas que tocamos, os sorrisos que despertamos.
E, assim, "O Sal da Vida" lembra-nos que a vida é um mosaico de instantes, e o sabor dela depende de quão presentes estamos para senti-los. É sobre encontrar plenitude no ordinário, beleza na simplicidade e valor nos momentos que, muitas vezes, parecem escapar pelos nossos dedos.
quarta-feira, 9 de outubro de 2024
CICATRIZES
As cicatrizes são lembranças
silenciosas que o corpo carrega, testemunhas do que já foi dor, mas que agora
repousam como marcas serenas. Cada uma tem a sua história, desenhada na pele,
no silêncio dos dias que passaram. São como pequenas geografias de nossas
batalhas, pedaços de um mapa íntimo, só nosso, que poucos conhecem de verdade.
Algumas cicatrizes são
profundas, outras quase invisíveis, mas todas falam sobre resistência. Falam do
que resistimos, do que sobreviveu. São marcas de curas tanto quanto são de
feridas. Às vezes, passamos os dedos sobre elas, num gesto automático, tentando
lembrar do que doeu ou agradecendo o que não dói mais.
Há também as cicatrizes que
não se veem. As que estão guardadas em camadas mais profundas, nas dobras da
alma. Elas são feitas de memórias, de sentimentos que cortaram fundo e que, aos
poucos, também foram cicatrizando. Embora invisíveis, essas talvez sejam as
mais difíceis de carregar, pois não há toque que alivie, nem remédio que cure
instantaneamente.
Mas, no fim, todas as cicatrizes – as do corpo e as do coração – são sinais de que seguimos em frente. São marcas de vida. Não importam os caminhos tortuosos que nos trouxeram até aqui, elas nos lembram que fomos fortes o suficiente para sobreviver. E é isso que importa.
terça-feira, 8 de outubro de 2024
DIZER NÃO COM VONTADE DE DIZER SIM
Dizer "não" quando a
vontade interna é de dizer "sim", constitui uma experiência que
envolve conflito entre desejo e razão. Isto pode acontecer por várias razões,
como medo de rejeição, pressão social, necessidade de agradar aos outros ou,
mesmo, o entendimento de que o "sim" seria prejudicial a longo prazo,
apesar do desejo imediato.
Esse tipo de conflito revela
uma luta interna entre os sentimentos e o sentido de responsabilidade ou
autocontrole. Muitas vezes, dizemos "não" para preservar os nossos
limites, manter a nossa integridade ou cumprir compromissos, mesmo que o desejo
profundo seja o oposto.
Quando se deseja algo, mas nos
sentimos presos por dizer "não", por dentro é como um turbilhão de
sensações contraditórias. Às vezes é aquele momento em que o corpo já deu todos
os sinais de que quer, de que deseja estar mais próximo, de que a conexão é o
que falta para fechar a lacuna entre nós e a outra pessoa. Mas a mente
interfere. Ela traz todas as dúvidas, as inseguranças, os medos.
Podemos estar ali, ao lado de
alguém, sentindo que o mundo poderia parar naquele instante e que só o toque, o
olhar, ou até mesmo o silêncio compartilhado, poderia fazer-nos sentir completos.
No entanto, dizemos "não" — talvez por medo de como a outra pessoa
vai reagir ou por um receio de estar indo rápido demais.
Por fora, pode parecer firme,
uma decisão concreta, mas por dentro é como segurar uma maré que nos quer
arrastar. Esse "não" vem com um gosto amargo, porque o
"sim" está-nos sufocando por dentro. A pele pode até arrepiar ao
imaginar o que poderia acontecer se simplesmente disséssemos o que queremos. Mas,
ao mesmo tempo, “aquela ponta de orgulho”, que todos conhecemos, soa que
admitir o desejo é uma derrota, uma perda de controle sobre quem somos.
Esse dilema entre o desejo e a
autoproteção é algo muito real, algo que todos nós já sentimos em algum nível.
É como se disséssemos "não" para evitar o possível desconforto de
sermos vulneráveis. Mas, com isso também nos privamos do prazer, da conexão,
daquilo que poderia ter sido um momento de intimidade profunda.
Esses sentimentos de tensão, vulnerabilidade e desejo são, afinal, parte do que significa ser humano!
segunda-feira, 7 de outubro de 2024
UM CONTO REAL
Imagine
um casal que, após uns anos de casamento, decide divorciar-se. A separação foi
dolorosa, mas inevitável devido a problemas que pareciam insuperáveis na época:
discussões constantes, diferenças de personalidade, talvez até o desgaste
natural do tempo, que deu origem ao aparecimento de uma nova mulher. No
entanto, mesmo com o divórcio assinado e cada um seguindo a sua vida, algo
profundo e inegável, permaneceu entre eles.
Encontravam-se
esporadicamente, em encontros casuais que inicialmente pareciam inocentes.
Talvez fosse um café rápido para falar sobre a profissão comum, um encontro por
acaso num lugar que costumavam frequentar juntos, ou uma mensagem enviada sem
pensar muito. Mas cada encontro reacendia uma chama, que nunca se apagou por
completo.
Nos
momentos em que estão juntos, há um silêncio que fala mais do que as palavras.
O toque das suas mãos ainda é familiar, o cheiro um do outro traz memórias
vívidas, e os olhares carregam uma mistura de saudade, carinho e tristeza. Eles
são amantes que conhecem cada detalhe um do outro, que já dividiram uma vida e
que, apesar de tudo, ainda se desejam de uma maneira que não conseguem
explicar.
Esses
encontros não são apenas físicos. Eles compartilham confidências, desabafam as
frustrações da vida pós-divórcio, e se apoiam numa intimidade que só eles
entendem. Há ali um conforto que é difícil encontrar noutro lugar, uma espécie
de porto seguro que, embora instável e cheio de contradições, ainda oferece
abrigo.
Por
mais que tentem seguir em frente, algo os puxa de volta um para o outro. Não é
apenas desejo, mas uma conexão profunda, que nunca foi realmente quebrada. Eles
são divorciados, mas também são amantes – de um amor que, mesmo cheio de falhas
e cicatrizes, se recusa a morrer.
Este relacionamento é um segredo, não apenas para os outros, mas até mesmo para eles próprios. Não há rótulos, promessas ou planos para o futuro – apenas momentos roubados, onde por alguns instantes, eles se permitem ser o que sempre foram, mesmo que isso não faça mais sentido para o mundo à sua volta.
sábado, 5 de outubro de 2024
O PRAZER DE SER MULHER
O prazer de ser mulher é uma
experiência íntima e profunda, que vai muito além das convenções sociais ou dos
padrões de beleza. Ele reside na capacidade de ser múltiplo: ser forte e
vulnerável, ser cuidadora e independente, ser criativa e pragmática. É
encontrar força nas próprias emoções, na conexão com o corpo e na liberdade de
ser quem se deseja ser, apesar das expectativas alheias.
Há prazer em se reinventar, em
cuidar de si e dos outros, em sentir orgulho das próprias conquistas. O prazer
de ser mulher está também na delicadeza de se reconhecer nas vitórias, no
autoconhecimento e na autonomia que só o tempo proporciona. É um sentimento que
floresce nas sutilezas da vida quotidiana, nas conversas íntimas, nas trocas de
olhares cúmplices, e no encontro consigo mesma em momentos de introspeção.
Ser mulher é um ato de
resistência e, ao mesmo tempo, de celebração. É a constante redescoberta da
própria essência e o caminho para a igualdade de género é feito de passos
silenciosos, muitas vezes sutis, que vão transformando a realidade ao longo do
tempo.
A igualdade começa, muitas
vezes, na forma como educamos as próximas gerações: na liberdade de deixar
meninas sonharem com o que quiserem e de permitir que meninos expressem os seus
sentimentos sem receio
A igualdade avança quando, em
pequenos círculos, valorizamos a voz da mulher em discussões profissionais, e
quando permitimos que ela seja ouvida sem interrupções. O caminho é pavimentado
por mudanças graduais nas mentalidades, nas estruturas e nas oportunidades.
Há uma beleza discreta em cada
ato que desafia as expectativas limitantes, em cada espaço que uma mulher
conquista, seja ele no campo pessoal ou profissional. A verdadeira igualdade alcança-se
quando se reconhece que, em toda a diversidade, há um valor único, e que as
diferenças podem coexistir em harmonia.
O movimento em direção à igualdade é contínuo, e cada passo, por menor que pareça, traz consigo o potencial de transformar gerações futuras.
Os cinco sentidos
Os
cinco sentidos são portais para o mundo, mas também para dentro de nós
próprios. Eles ligam-nos às nuances mais sutis da existência, revelando camadas
de sensações que, muitas vezes, passam despercebidas no turbilhão da vida.
O
tato é o primeiro sentido a manifestar-se, o mais primitivo. É sentir a
textura de uma flor entre os dedos, o calor reconfortante de uma mão que se
entrelaça na nossa, ou o abraço acolhedor de uma manta numa noite fria. O toque
lembra-nos que somos feitos de matéria, mas também de afeto, de vínculos que se
expressam na pele.
O
olfato é memória. O cheiro do café fresco, da terra molhada pela chuva,
ou do perfume que traz de volta um momento perdido no tempo. É a magia
silenciosa que nos transporta para longe, para perto de quem fomos, de onde
estivemos, e das histórias que nos marcaram.
O
paladar revela o prazer e a simplicidade da vida. Uma fruta doce que
explode na boca, uma comida feita com carinho, um sabor familiar que nos
acolhe. Cada sabor é uma forma de comunicação íntima com o mundo e com o nosso
próprio corpo, uma lembrança da beleza das pequenas coisas.
O
ouvido convida a escutar mais do que palavras. É no silêncio entre os
sons, no sussurro do vento, num riso distante ou no murmúrio de uma melodia,
que encontramos a profundidade das emoções. A audição tem o poder de nos levar
para dentro de nós mesmos, de nos fazer ouvir o que sentimos, mesmo quando o
coração está em silêncio.
E
o olhar? Ah, o olhar. É através dos olhos que o mundo se desenha em
cores e formas. Mas, mais do que isso, é nos olhares cruzados que encontramos a
verdade dos sentimentos. Um pôr do sol que deixa o peito apertado, o brilho nos
olhos de quem amamos, a expressão contida de uma saudade — os olhos capturam o
que a alma tenta esconder.
Cada sentido é uma porta de entrada para o mundo exterior, mas também uma jornada para dentro, onde ressoam as lembranças, os afetos e as emoções que nos definem. É nos pequenos detalhes, capturados pelos sentidos, que encontramos a poesia da vida.
sexta-feira, 4 de outubro de 2024
OLHAR OU VER?
"Ver" e
"olhar" embora ligados à visão, têm entre nós nuances diferentes. De
fato, ver refere-se ao ato de perceber algo com os olhos, de forma
automática ou sem intenção. É um processo mais passivo. Já o olhar implica direcionar a atenção
para algo, de maneira deliberada. É um ato mais intencional.
Enquanto "ver" está
ligado à perceção visual geral, "olhar" envolve foco e intenção.
Ver é algo quase involuntário, como uma
abertura natural dos sentidos ao mundo. Quando alguém vê, o ato é imediato, não
exige esforço nem escolha — o mundo revela-se, mas de maneira superficial. Ver
é como passar os olhos pela vida, absorvendo a superfície das coisas, sem
realmente se conectar profundamente. É como estar num ambiente e apenas
perceber a existência do outro sem, de fato, o enxergar.
Olhar, por outro lado,
é um gesto carregado de intenção, uma escolha de quem decide mergulhar naquilo
que está diante de si. Olhar envolve tempo, presença e curiosidade. Quando você
olha, há um convite silencioso para conhecer além do que é óbvio, para captar
detalhes que podem ser invisíveis ao simples ato de ver. Olhar alguém nos
olhos, por exemplo, é uma maneira de reconhecer sua existência, de tentar
desvendar o que está para além da aparência — como se, ao olhar, você também
estivesse procurando ver-se refletido no outro.
Assim, enquanto ver é um gesto automático e externo, olhar é um ato íntimo e profundo, que requer entrega e atenção.
quinta-feira, 3 de outubro de 2024
QUANDO O CORPO FALA POR NÓS
"Quando
o corpo fala por nós" pode ter um significado muito pessoal e profundo,
pois o corpo se torna uma extensão direta das nossas emoções, experiências e
vivências, mesmo que às vezes não estejamos conscientes disso. Em momentos de
grande emoção — seja tristeza, alegria, ansiedade ou amor — o corpo reage de
formas que podem surpreender, revelando aquilo que talvez as palavras não
consigam expressar com precisão.
Por
exemplo, numa situação em que se está diante de alguém importante, mas se tenta
manter a compostura, o coração pode começar a bater mais rápido, as mãos podem
suar ou tremer, e talvez se perceba uma tensão nos ombros ou uma respiração
mais curta. Mesmo que não se diga nada, esses sinais falam sobre a intensidade
do que se está sentindo por dentro.
Em
situações de tristeza, o corpo pode manifestar-se com olhos marejados, um
aperto no peito, uma vontade de se encolher, como se precisasse de proteção. Da
mesma forma, a alegria autêntica pode iluminar o rosto de alguém, com um
sorriso genuíno, relaxamento nos músculos, e até lágrimas de felicidade.
Outro
exemplo profundo é o cansaço emocional. Quando passamos por situações
desgastantes, como estresse prolongado ou um conflito interno, o corpo
manifesta-se frequentemente com dores, tensões, ou até problemas de saúde,
mostrando que algo dentro de nós precisa de atenção, mesmo que tentemos ignorar
ou racionalizar.
Nos
momentos mais íntimos, o corpo também fala quando as palavras não são
suficientes para traduzir o que estamos vivendo. Seja uma troca de olhares, um
toque suave no braço de alguém querido, ou a maneira como inclinamos a cabeça
para ouvir melhor, esses gestos expressam sentimentos que talvez não
conseguíssemos articular.
Cada
pessoa tem uma forma única de manifestar o que está sentindo fisicamente, e
prestar atenção ao que o corpo comunica, pode ajudar-nos a entender melhor as nossas
emoções, especialmente aquelas que não conseguimos colocar em palavras.
Esse conceito é sobre a linguagem íntima e pessoal entre corpo e alma, onde o físico e o emocional se entrelaçam de maneira silenciosa, mas profundamente reveladora. O corpo se torna uma janela para o que guardamos dentro de nós.