sexta-feira, 26 de setembro de 2014

O sofrimento

Quando se perde um filho, nada do que depois possa acontecer-nos tem grande importância. E talvez só esta hierarquização do sofrimento, explique que eu por cá continue, tentando levar a minha vida por diante, com um sorriso nos lábios.
Infelizmente este ano de 2014 tem martirizado vários amigos meus. São doenças, são desilusões, são fracassos, são perdas. A que se junta, há que dize-lo, um clima social de tensão quase permanente, que corporiza o velho ditado " casa em que não há pão, todos ralham e ninguém tem razão".
Talvez porque me julguem mais sadia ou mais forte - sabe-se lá o que os outros pensam de nós - a verdade é que muitos deles me procuram e desabafam as suas mágoas. É uma prova de confiança que me dão, mas à qual só posso responder com a minha experiência pessoal. Fiz análise, julgo conhecer-me um pouco melhor do que antes dela, mas o sofrimento é, sempre, um domínio profundamente solitário. Diria mesmo que é a área mais solitária da nossa vida.
Partilha-lo é, para alguns, uma catarse absolutamente indispensável. Para outros, ao contrário, é algo de impensável, se a dor for muito profunda. Chorar talvez seja para esta última categoria, a solução possível. Só que não chora quem quer, mas sim quem pode. E, sei-o, nem sempre é fácil, nem sempre é possível.
Porém, há algo que todos podemos fazer. É rodear de carinho, de interesse pessoal, de solidariedade, todos aqueles que estão em sofrimento. E não deixar para amanhã um telefonema, um mail, uma visita, enfim, até uma oração. O sofrimento dos outros pode ser, também, um dia, o nosso...

HSC

24 comentários:

CF disse...

Concordo em absoluto, o sofrimento é uma coisa pessoal. A necessidade de deitá-lo para fora é uma busca de alívio, que pode colher frutos. Mas só depois de sofrermos e de alojarmos de novo o que se sofreu, como parte de nós... Nem sempre sou boa nessa partilha. Sou atabalhoada, trapalhona, sou muito melhor a escutar... :)

( Falo do sofrimento dito mais "normal". Não me atrevo a entrar no que descreve, mas acredito em tudo o que diz...)

Um beijinho.

João Menéres disse...

Apreciei muito a sua explanação.

Melhore cumprimentos.

Anónimo disse...

...hirarquização ...
...esta ano de 2014...

Gralhas :-(




Dalma disse...

É isso mesmo, " não deixar para amanhã um telefonema, um mail, uma visita, enfim, até uma oração..." Porque amanhã pode ser tarde. Alguém também me ensinou "não te venhas a arrepender de não teres feito"!

Anónimo disse...

Completamente de acordo.
Permita-me destacar dois excertos do seu texto:
- "Só que não chora quem quer, mas sim quem pode. E, sei-o, nem sempre é fácil, nem sempre é possível".
- "É rodear de carinho, de interesse pessoal, de solidariedade, todos aqueles que estão em sofrimento. E não deixar para amanhã um telefonema, um mail, uma visita, enfim, até uma oração".

Solidariedade, sempre!

Cumprimentos

Virginia disse...


Acho que o sofrimento é um estado de espírito absolutamente pessoal e intransmissível. Pessoalmente só consigo partilhá-lo com os meus filhos e por vezes até prefiro estar sozinha. Não sei como é que as pessoas pensam que terceiros nos podem dar a resposta para superarmos a dor.
A relativização por comparação com outras situações à nossa volta pode dar-nos alento....

Anónimo disse...

Hand on hand.

A

CA disse...

Helena, com a sua licença...

Cara Virginia,

a questão, se analisada de diferentes ângulos, tornará claro que o objectivo, seja em processo de relação terapêutica formal, seja no seio de uma relação de amizade, assentará, sempre, não no fornecer uma resposta, mas no ajudar o interlocutor a encontrar dentro de si respostas, à sua medida, por meio, em parte, do olhar crítico sobre a forma como nos relacionamos connosco, com os outros (como nos construímos), por referência, quer ao cânone, quer por referência à construção individual do nosso interlocutor.

É justamente nessa, para mim, falácia, que assentam, infelizmente, muitos livros de auto-ajuda: vender a ideia de que existe uma resposta, clara, objectiva e universalmente válida para determinadas problemáticas.

Querer aplicar esse tipo de raciocínio - matemático - a dimensões humanas, dos sentimentos e emoções humanas... é, parece-me, gerar, logo à partida, condições para a frustração.

Anónimo disse...

A 'velha senhora' concorda e comenta:

linda menina, ó grande helena!
sofre por si e mais por quem
tais sofrimentos tem também.
não é, helena, alma pequena!

Anónimo disse...

Maravilhoso, mesmo que brutal! Revejo-me em cada palavra sua. Obrigada.

CC

bea disse...

Bem verdade. A companhia, o carinho e a compreensão dos outros é fundamental. Ajudam a aguentar o que não se imagina como se aguenta.

Anónimo disse...

Que o Espírito Santo a proteja.E a todos nós.

Fatyly disse...

Tal e qual e revi-me em cada palavra sua. Todos os dias tento praticar o referido no seu último parágrafo porque infelizmente muitos esquecem-se de pequenos pormenores e só quando morrem é que vão de velinha e flores na mão com um ar de pesar. O que refiro é tão comum nas famílias...e sei bem do que falo!

Nãooooooooo e nãooooooooo e como não deixo para amanhã o que posso fazer hoje e porque não tenho outro modo de...

deixo-lo um enorme abraço sincero e com imenso carinho.

Anónimo disse...

Dizem que sem sofrimento não existe arte.
Entendo porquê. Tal como diz HSC, é difícil encontrar meios que traduzam o sofrimento e o comuniquem aos outros.

Considero que o mesmo se passa relativamente a qualquer vivência emocional, tanto de sinal positivo, como de sinal negativo.

As vivências emocionais não são abstratas, e cada caso é único.
E é aqui que entra a necessidade de o ser humano se exprimir através da arte, nas suas várias formas e meios.

Mas isso não tem a ver com isolarmo-nos na dor.

Uma coisa é os outros saberem que sofro porque perdi alguém muito querido e termos o seu apoio.

Outra coisa é aquele núcleo de sofrimento que, na maior parte das vezes, nem para nós mesmos conseguimos verbalizar.

E quando conseguimos fazê-lo, mesmo que só para nós próprios, isso é muito libertador.

Anónimo disse...

*_* Believe *_*

Ghost Casper

Alcipe disse...

Gostei muito deste seu texto

a) Alcipe

Anónimo disse...

Bom dia Helena!!
É sempre tão explicíta, entendo-a tão bem...
Concordo consigo em tudo!!!

"julgo conhecer-me um pouco melhor do que antes dela"

Passou-se o mesmo comigo, sem duvidas que hoje conheço-me muito melhor, conhecendo-me hoje fazia todo diferente...
Tenho pena de muitas coisas, mas felizmente já consigo ter menos culpabilidade, é na dor que aprendemos o bom e mau, todo é uma aprendizagem, aprender a suportar a dor é algo só nosso.
Gosto de si, não porque sim, mas por tudo que que nos têm ensinado.

Carla

clarisse castro disse...

Se estivermos atentos (aos Outros) o estado de sofrimento e também o de alegria, embora se alternem, são constantes... :) :(

Anónimo disse...

Senhora,sofrer é ter que esperar quinze dias para lhe poder enviar um presente.

Ambrósio

Helena Sacadura Cabral disse...

Ó Ambrósio não sofra, não espere, não se amofine. Um Ferrero resolve o problema!

Anónimo disse...



(todo- castellano) más un poco y André vá cambiar las palabras como yo!!

:) Carla

Anónimo disse...

Senhora,estou mesmo amofinado...mas foi porque domingo passado perdi o meu fiel amigo de há 13 anos nos meus braços..O meu Scooby dança agora nas nuvens do infinito.
Não há quem me console da dor.

Ambrósio

Helena Sacadura Cabral disse...

Ambrosio, não se amofine. O caozinho está entre os amigos!

Helena Sacadura Cabral disse...

Alcipe
Muito obrigada!