terça-feira, 14 de julho de 2009

O português e a matemática

A maioria dos estudantes têm um medo atávico da matemática e do português. Os anos vão passando, as reformas vão-se sucedendo, mas o terror mantem-se. E os resultados dos exames são reveladores deste estado de espírito. Num ano pioram as notas da língua mãe. No outro, agravam-se as classificações da ciência dos números.
Este quadro evidencia, a meu ver, duas lastimáveis facetas: o desinteresse pela leitura -arma indispensável para o domínio da língua - e a diminuta racionalidade de que o espírito matemático é paradigma. Ou seja, em termos muito simples, o que nos caracteriza é uma certa forma de mediocridade.
O interesse pela leitura costuma nascer do contacto com meios culturais mais exigentes. E a curiosidade pela matemática costuma nascer do contacto com os meios científicos. Num país em que o que mais interessa é a melhoria das estatísticas da educação e não o conteúdo dessas estatísticas, torna-se absolutamente natural que se tenha um vocabulário diminuto, se fale gramaticalmente mal e se não saiba bem uma qualquer tabuada que facilite o cálculo mental.
Neste enquadramento, não surpreende afinal, que se não percebam os formulários, se não acompanhem as legendas dum filme, se não saiba o que é uma raiz quadrada. E, pior, se não tenha, sequer, consciência da gravidade que essa situação representa. É que a língua e a matemática, para o bem ou para o mal, fazem parte do nosso quotidiano.
Mais, a simples distinção entre o gosto pelas letras ou pelas ciências, é bem reveladora de uma concepção ultrapassada da nossa actual realidade.
O português e a gramática, a matemática, assim como a história e a geografia, deviam fazer parte de todo o estudo pré-universitário. E não seria demais!

H.S.C

5 comentários:

hfm disse...

Eu acrescentaria ainda a filosofia a que abre o espírito na luta pelo conhecimento, pela procura, pelos diversos tipos de formulação de ideias e ainda pela discussão subjacente. Argumentar, pensar e estar aberto a novas situações seriam para mim os fundamentos necessários a qq ser humano especialmente no ensino pré-universitário.

Helena Sacadura Cabral disse...

Tem toda a razão. A filosofia também.

LVD disse...

Creio não estar errada ao afirmar que a filosofia é, actualmente, a única disciplina comum a todas as áreas do secundário.
Muito necessária, sem dúvida.
Mas o sucesso das já citadas formulação de ideias e sua discussão, por exemplo, estão dependentes da capacidade de interpretar e raciocinar, que é como quem diz que sem o português e a matemática nada feito.
Quanto às estatísticas... são como os fatos de banho: revelam muita coisa mas escondem sempre o mais importante!

Anónimo disse...

Um Post muito pertinente, este que aqui publica Helena Sacadura Cabral. Que subscrevo nas críticas e observações feitas a propósito. Permitia-me acrescentar ainda assim, o seguinte: em minha opinião, uma das razões porque o ensino se deteriorou bastante nestas ultimas décadas, foi o facto de ter deixado de haver “exigências regulares” para com os alunos, ou seja, de se terem extinto os exames, como existiam e muito bem há uns anos atrás (4ª classe, admissão ao Liceu, 2º, 5º e 7º anos desse mesmo Liceu). Isto porque os alunos foram-se habituando a “passagens administrativas”, à falta de esforço, a não serem obrigados a estudar com afinco e de uma forma regular, visto não terem de ser submetidos a provas eliminatórias exigentes, os exames nacionais. Assim, chegam ao que é hoje o 12º, para só aí terem de enfrentar uma avaliação a sério. E para se defenderem dessa “provação”, em vez de estudarem, “marram”. Temos “marrões” a engrossar as universidades, em vez de alunos que ao longo da sua vida académica aprenderam o que era “o ter de estudar” (compreender é distinto de decorar). A juntar este anacrónico “sistema de ensino”, que há anos subsiste, temos o facilitismo redundante que consiste em elaborar testes, ou provas de exame mais “acessíveis” para melhor permitir a passagem desses alunos e assim ver subir as estatísticas! Já se tinha facilitado ao longo dos 11 anos anteriores ao não haver exames rigorosos, nacionais, com dantes, agora “compõe-se” uns testes “mais fáceis” para a “malta entrar nas faculdades”! Por outro lado, verifica-se hoje uma lamentável pouca apetência pela leitura por parte dos alunos. Há uns anos atrás, era já enquanto estudante que se ia “fazendo a nossa biblioteca”, hoje a rapaziada, na sua maioria, não compra livros e nem sequer os lê. Através da Net pesquisam trechos desses mesmos livros, respingam-nos e já está! E como os professores não podem castigar, expulsar das aulas, expulsar da escola, ralhar com eles, chumba-los, tirar-lhes os telemóveis nas aulas, manda-los calar, etc, porque estão completamente desautorizados – contrariamente aos ditos, a quem tudo é devido, “coitadinhos”! - e lhes está vedado tais atitudes, esta gente chega ao 12º numa lástima, de uma maneira geral. Haverá seguramente alguns que percebem que as coisas não são assim e estudam durante esta sua vida escolar, mas não são a maioria. E depois chocam, mais tarde, com a vida real, onde todos são avaliados nas suas vidas e carreiras profissionais (com a excepção dos políticos). Por fim, julgo que ao alterar a cadeia hierárquica personalizada num Director, ou Reitor, num “autoridade colegial” como é o caso dos “conselhos directivos”, não só se dissolveu a autoridade de quem em última instância devia ser o principal responsável, perante o qual responderiam os alunos em falta grave, como se diminuiu essa mesma autoridade, quer perante esses mesmos alunos, quer mesmo perante os próprios professores. Tem de haver sempre uma autoridade, onde quer que seja, a quem se exige responsabilidades, mas também se espera nos chame à atenção se as coisas correrem mal.
P.Rufino

Adelina Silva disse...

Concordo muitíssimo com o que escreve. Como professora debato-me no dia-a-dia com essas "lastimáveis facetas".
Há uns anos via-me a definhar e já me imaginava a ler e a escrever como os alunos. O nível é tão básico que nós, se não nos acautelamos, acabamos também básicos.

Abraço