domingo, 9 de novembro de 2025

QUEM NÃO TEM CÃO…

Diz-se por aí que, “quem não tem cão, caça com gato”. Há pessoas que, quando a situação aperta, parece que viram ninjas. Acabou a solução óbvia? Eles inventam outra. O plano deu errado? Eles criam um plano Z, em cinco minutos, e ainda riem do processo. São os verdadeiros representantes do ditado: “Quem não tem cão, caça com gato.”

Mas o ditado é sábio e um pouco malandro. Ele não fala de caçada, fala do improviso. É o resumo português da “arte de dar um jeitinho” quando falta o ideal. Não tem impressora? Vai em foto de telemóvel. O café acabou? Água quente e fé. O plano A deu errado? O B, o C e o D já estão em modo de espera, tremendo nas bases.

“Caçar com gato” é viver no improviso, mas com estilo. É usar clipe no lugar do agrafo, sapato no lugar do martelo e criatividade no lugar dos recursos. Porque, no fim, o gato pode até não ser o cão, mas traz charme, elegância e, com sorte, um bom meme.

Então, da próxima vez que faltar o “cão” na sua vida - seja um recurso, uma pessoa ou um plano - lembre-se de que o gato está aí. Preguiçoso, talvez. Mas quem sabe se ele não dá um jeito diferente (e mais divertido) de conseguir o que queremos? 

 

sexta-feira, 7 de novembro de 2025

AS FOLHAS DO OUTONO

As folhas do outono dançam ao sabor do vento, num ballet silencioso de despedidas. As suas cores — dourado, vermelho e castanho — pintam a paisagem com tons de melancolia e beleza. Cada folha que cai, conta uma história de tempo, de transformação e de ciclos que nunca cessam.

Há algo de sereno, nesse cair lento, como se a natureza respirasse fundo, antes do repouso do inverno. As árvores, agora mais leves, preparam-se para recomeçar, lembrando-nos que a vida também é feita de deixar ir.

O outono ensina o valor do desapego, a arte de aceitar as mudanças e a certeza de que até o fim pode ser belo. Porque, assim como as folhas, nós também precisamos cair, mudar e renascer — sempre com as cores da experiência, gravadas na nossa alma.

 

terça-feira, 4 de novembro de 2025

HUMOR E HUMILDADE

Eu sei que os humoristas me vão matar e considerar alguém que não entende o seu trabalho. Não é verdade. A família já foi -é – alvo de diversos tipos de “humores” …

O humor e a humildade são duas características essenciais que influenciam significativamente a maneira como nos relacionamos com os outros e como vemos o mundo à nossa volta. Embora à primeira vista, possam parecer opostos, quando combinados de maneira adequada, podem resultar numa abordagem equilibrada e saudável da vida.

O humor, quando usado com inteligência e sensibilidade, é uma ferramenta poderosa para promover conexões interpessoais, aliviar tensões e enfrentar desafios com leveza. A capacidade de rir de si mesmo e encontrar o lado cómico das situações, pode ajudar a reduzir o stresse e a ansiedade, além de promover um ambiente mais descontraído e inclusivo nas interações sociais.

No entanto, importa exercer o humor com humildade e respeito pelos sentimentos dos outros. O que pode ter graça para uma pessoa, pode ser ofensivo para outra, e é fundamental estar ciente das diferenças individuais e dos limites de cada um. Além disso, é importante reconhecer que o humor não deve ser usado como uma forma de ridicularizar ou menosprezar os outros, mas sim como uma forma de criar conexões genuínas e até promover um sentido de camaradagem.

Por outro lado, a humildade é uma qualidade que nos permite reconhecer as nossas próprias limitações, aprender com os erros e aceitar as contribuições dos outros. Ao cultivar a humildade, somos capazes de nos relacionar de maneira mais autêntica com os que nos rodeiam, demonstrando abertura para diferentes perspetivas e experiências.

A combinação de humor e humildade, convida a abordar a vida com uma atitude de leveza e aceitação, reconhecendo a importância de não nos levarmos a nós mesmos muito a sério, e a estarmos abertos à aprendizagem contínua. Ao integrar essas duas qualidades na nossa maneira de ser e de interagir, podemos criar relações mais significativas e construir um ambiente mais positivo e inclusivo para todos.

 

segunda-feira, 3 de novembro de 2025

MEDITAÇÃO TRANSCENDENTAL

A Meditação Transcendental (MT) é uma técnica de meditação introduzida por Maharishi Mahesh Yogi, na década de 1950, fundamentada na repetição silenciosa de um mantra específico. Praticada geralmente durante 15 a 20 minutos, duas vezes ao dia, em posição confortável e com os olhos fechados, a MT visa conduzir a mente para além da atividade mental superficial, alcançando um estado de consciência, caracterizado por profundo repouso fisiológico e alerta mental. Pratico-a desde que o meu filho Miguel partiu.

Diferente das práticas que exigem concentração ou controlo ativo dos pensamentos, a MT é descrita como um processo natural e sem esforço, que permite alcançar o chamado “estado transcendental”. Pesquisas científicas, que posso confirmar, associam esta prática a benefícios psicológicos e fisiológicos, como redução do stresse e da ansiedade, melhoria da saúde cardiovascular, maior clareza cognitiva e aumento do bem-estar geral.

Nos últimos anos, a Meditação Transcendental tem vindo a ganhar reconhecimento, também entre nós, sendo praticada tanto em contextos individuais como em programas de promoção da saúde e do equilíbrio pessoal, o que reflete o crescente interesse pelas práticas de desenvolvimento interior.

 

domingo, 2 de novembro de 2025

O ELOGIO DA VAIDADE

A vaidade, tantas vezes condenada como um vício moral, talvez mereça uma reconsideração mais justa. Sob o olhar atento da razão e da história, percebe-se que ela não é apenas um espelho do ego, mas também um motor silencioso do progresso humano. É a vaidade que desperta no indivíduo o desejo de se distinguir, de se aprimorar, de alcançar a excelência que o olhar do outro confirma.

Longe de ser mera frivolidade, a vaidade é uma forma de auto-perceção que se pode transformar em consciência estética e ética. O cuidado com a aparência, quando não se reduz à superficialidade, revela também o respeito por si e pelos outros. O homem ou a mulher vaidosa, no melhor sentido, não buscam apenas admiração, mas harmonia — entre o interior e o exterior, entre o que são e o que mostram ser.

Na arte, na ciência, na política, a vaidade tem sido impulso e combustível. O desejo de reconhecimento, moveu pintores a criar obras imortais, cientistas a desafiar o impossível, estadistas a sonhar com glórias nacionais. Ainda que o aplauso seja efémero, ele serve como medida simbólica do esforço e do valor.

O perigo da vaidade não está na sua existência, mas no seu excesso — quando o espelho se torna prisão, e o olhar do outro, tirano. Porém, extirpá-la completamente, seria apagar uma das forças que mais profundamente moldaram a cultura humana.

Elogiar a vaidade, portanto, é reconhecer o poder ambíguo que habita em nós: o desejo de ser visto, lembrado e admirado. É admitir que, entre o orgulho e a humildade, há um território legítimo, onde a vaidade, com sua luz e sua sombra, nos ensina a ser mais humanos.

 

sábado, 1 de novembro de 2025

OS IMPROVISADORES

Há quem precise de roteiro para viver. E há quem se lance no vazio do momento, confiando que o chão vai aparecer — ou que, se não aparecer, ao menos o tombo, possa render boas gargalhadas. Os Improvisadores pertencem a esse segundo grupo: artistas do instante, trapezistas sem rede, poetas do agora.

Sobem ao palco com o mesmo desassombro de quem entra num sonho, sem saber o final. O público lança palavras, ideias, desafios absurdos — e eles transformam tudo em cenário. Um amor impossível entre uma torradeira e um astronauta? Uma tragédia no supermercado? Um rumba sobre a reforma tributária? Eles aceitam. E fazem.

Improvisar é brincar de ser deus e criatura, ao mesmo tempo. Inventar o mundo e habitá-lo. É uma arte que nasce e morre diante dos olhos, sem reprise, sem edição, sem chance de “depois nós melhoramos”. Cada erro vira escada, cada tropeço vira piada.

Há um tipo de magia nisto: o riso cúmplice de quem assiste e percebe que, por um instante, todos estão a criar juntos — artistas e plateia respirando o mesmo susto, o mesmo encanto.

Quando as luzes se apagam, nada fica gravado. Só o eco de algo que foi único, efémero e vivo. Porque improvisar, no fundo, é isso: provar que o instante basta!

 

sexta-feira, 31 de outubro de 2025

A LINGUAGEM DO SILÊNCIO

O silêncio, muitas vezes visto como ausência de som, é, na verdade, uma forma poderosa de comunicação. Ele fala onde as palavras falham, revela o que o discurso tenta esconder e expressa sentimentos que a voz não alcança. A linguagem do silêncio é universal: atravessa fronteiras, culturas e épocas, sendo compreendida por todos, ainda que de maneiras diferentes.

Em certas situações, o silêncio é respeito — diante da dor, da morte ou de uma revelação profunda. Em outras, é protesto — quando a palavra seria inútil ou seria abafada pelo ruído da incompreensão. Pode ser também cumplicidade, como o olhar silencioso que une dois amigos, ou amor, como o gesto tranquilo que diz mais que mil declarações.

No entanto, o silêncio também pode ser opressão. Há silêncios impostos, nascidos do medo, da censura ou da indiferença. Nesses casos, ele deixa de ser escolha e torna-se prisão, um espaço onde a voz humana é negada. É preciso, então, aprender a distinguir o silêncio que comunica, do silêncio que cala.

Saber usar o silêncio é uma arte. Ele exige sensibilidade e escuta atenta. Num mundo saturado de ruídos e opiniões, o silêncio pode ser um refúgio, uma pausa necessária para que o pensamento floresça. É nele que as palavras ganham sentido, pois é o silêncio que as antecede e as sucede.

Assim, compreender a linguagem do silêncio é compreender a essência da comunicação humana. Porque nem sempre é o que se diz que importa — mas o que se cala, e como se cala.