sexta-feira, 30 de julho de 2010

Um abrasador cansaço...

Ontem saí para jantar com amigos. Bairro Alto. O parque subterrâneo queimava os pneus. Os meus saltos discutiam com a bela calçada portuguesa. O restaurante tinha o nome de Esperança, mas ela esvaiu-se logo à entrada. O ar condicionado ligado e três portas abertas de par em par, deixavam qualquer um numa lástima.
Eu, qual espanhola prevenida, abanicava-me com um leque chinês. A luz de velas mínima não permitia a leitura do cardápio. Encomendei de cor e salteado um carpaccio de carne. Erro fatal. O dito fora cortado muito congelado e a água ensanguentada tirava-lhe todo o viço. Aguardei, mesmo assim, o moinho de pimenta que não apareceu. Depois percebi. Já vinha apimentado. Recusei. Se pago tenho direitos implícitos. Veio novo carpaccio. Sem pimenta. E sem pimenteiro também. Degluti, abanando-me.
De repente o ruído dos jovens que chegavam impediu que conseguissemos falar. Passámos a gritar. As pizzas dos meus amigos pareciam tão desfalecidas quanto o meu milimétrico lombo...
Resolvemos "desabancar" e ir comer um gelado. Eles. Eu não tinha capacidade, sequer, para dar ao queixo. Na gelataria, idem. Os cremes pareciam água. Fenecidos. É da crise, pensei.
Mesmo assim, os amigos comeram. Melhor, tentaram. Acabaram por beber o líquido. Eu só vi.
Iamos ficando progressivamente mais calados. De novo, o parque subterrâneo do Camões, mais abrasador ainda. A cheirar a borracha e tubos de escape.
Entro em casa qual Cinderela desfeita. Fui ao meu terraço. Nem uma brisa. O termómetro deixado pelo cônjuge, marcava 35º.
Hesitei em ir ou não, dormir para um hotel. E mal disse a minha decisão de não ter ar condicionado. Deitei-me com duas colunas ventoínhas a sugarem-me os lençóis. Acordei vagamente constipada.
Há dias, há noites, há calores, que não deviam existir. Para os quais não estou vocacionada. Em solidariedade com a autora do blogue Criativemo-nos, declaro que fui invadida por um abrasador cansaço...
HSC


5 comentários:

Anónimo disse...

Já para não falar dos "afrontamentos"
Até parece... Não nos bastam os calores da temperatura...Pois e parece mal admitir... ou é pouco sensual... ou...
Como se não os sentíssemos...
Ai doutora Helena
sem querer ser lamechas...
Como me identifico
Isabel Seixas

Se ao menos o derreter fosse localizado e consentâneo com o nosso querer...
é a vida

Lura do Grilo disse...

"O dito fora cortado muito congelado e a água ensanguentada tirava-lhe todo o viço." Horror...detesto quando a carne aparece assim.

Quanto às ventoinhas é de evitar: arranjam-se algumas "esmolas" para os pulmões com estes artefactos.

Se o chão for de tijoleira vale a pena passar uma esfregona com água de vez em quando: ajuda a arrefecer um pouco.

margarida disse...

Milady, que texto de-li-ci-o-so!
Mas carne crua, deuses, nem em sonhos!
Então e os maravilhosos gelados do Santini?!
E uma promenade à beira Tejo?!
:)))
E...um jantarinho mimoso chez Milady?! Assim, sim!
Os convidados levavam ventoinhas em vez de garrafas de Barca Velha...
Seria um sucesso...

helenabranco.poet@gmail.com disse...

comentar...não gosto da expressão substituo por com versar e versar porque penso que a conversa devia mesmo descontraída ser um verso assim consistente, deprimente ou de alegria real ou fantástico para que não andassemos por aí aos milhares a dizer sim...não talvez ah! oh! lindo...Amigo etc agora somos todos amigos! era bom se o fosse...mas para ser-se amigo é preciso ter coragem! ...nos dias de hoje para dizer o que é preciso e calar o que não acrescente...Bem comecei pelo fim sem primeiroter dito que, sendo uma ilustre desconhecida sempre tive a curiosidade, mais tarde o gosto de a ouvir. Mesmo que o assunto seja sério e a cara adequada ao estado da situação,um sorriso peculiar baila sempre e se acontece o riso é mesmo de dentro...isto e o facto de a considerar uma mulher-mãe de facto (perdoe a redundancia)...
O que nos conta acima é outra realidade que dasapega o brio e o orgulho de qualquer, pior é que grassa como doença e é a doença do desinteresse e respeito pelo outro.
Cumprimenta-a Helena Branco

Helena Sacadura Cabral disse...

Cara Helena, apareça que o gosto é todo meu.
Ó querida Maggie eu bem disse que mesmo com 35º era melhor comer cá em casa. Mas fui convidada e os amigos tinham achado muita piada ao Esperança...no Inverno. No Verão, está visto, vira inferno. Pois eu também sugeri irmos a outra gelataria mas esta era de gente próxima e fazia parte da cadeia de "comércio justo". Afinal foi bastante injusto...
Lura parte da minha despesa de água deve-se à frequência com que lavo 30 metros quadrados de tijoleira. E se lhe juntar a cera acrílica vermelha, o meu invejável terraço vira "uma amante de luxo", como diz um amigo meu muito machista, e também muito esquerdista!