quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

SE O ARREPENDIMENTO MATASSE

Há dias em que o arrependimento pesa sobre o peito como um sopro abafado, um sussurro que se arrasta pelos cantos da memória e acaba por erguer muros dentro de nós. É um sentimento denso, de contornos quase invisíveis, que se insinua no silêncio, nos intervalos entre um pensamento e outro, na brisa leve que entra pela janela sem pedir licença. Diante dele, tudo que não fizemos, tudo que deixámos para depois, tudo o que fingimos que não importava, retorna na forma de fantasmas: palavras que nunca foram ditas, olhares que não se cruzaram, cartas que ficaram fechadas em gavetas empoeiradas de incerteza.

Carregamos o eco dos gestos contidos, dos abraços que não demos, das confissões sufocadas pelo medo de ser julgado ou não compreendido. O arrependimento é a morte lenta das possibilidades que, um dia, pareceram eternas e inquebrantáveis. É testemunhar, impotente, o desbotar de cores que, um dia, foram vívidas e o ranger de portas que se fecharam para sempre. Há uma certa melancolia na perceção de que nem sempre é possível retornar aos instantes onde a escolha andava no ar, esperando que estendêssemos a mão e a recolhêssemos para dentro de nós, transformando-a em realidade.

Porém, talvez haja um consolo neste desconforto: o arrependimento também é um lembrete de que somos humanos e falíveis, um convite a reconhecer as nossas limitações e fragilidades. É no amargor das oportunidades desperdiçadas que encontramos o fermento para novas tentativas. A dor de não ter tentado abre espaço para a determinação de não mais hesitar. O remorso, por si só, não reverte o passado—mas pode iluminar o caminho adiante, ensinando-nos a não fugir do que sentimos, a não nos intimidarmos pelo que não sabemos, a não poupar ternura e honestidade quando o coração a pede.

Assim, resta-me carregar o arrependimento como um espelho que me faz encarar a mim mesmo, com meus lapsos, silenciosas covardias e arroubos de orgulho. E, ao fazê-lo, crescer na direção da coragem, da transparência e do cuidado com o agora. É nessa assimilação lenta que repousa a chave para um futuro menos marcado pela dúvida e mais iluminado pela clara vontade de viver com autenticidade.

3 comentários:

Pedro Coimbra disse...

Conhece alguém que olhe para trás e não se arrependa de algo que tenha feito ou deixado de fazer?
Todos temos essa característica em comum.
Somos seres imperfeitos, é natural.
Tenha um Santo Natal

Helena Sacadura Cabral disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Helena Sacadura Cabral disse...

Quer acreditar que apenas considero ter cometido um grade erro na vida de que me arrependerei sempre. E desse levei muito tempo a perdoar-me. O resto foram fracassos maiores ou menores mas de que não há qualquer arrependimento. Apenas pena, mas não marcaram!
Um Bom Natal para si e todos os seus!