sexta-feira, 27 de junho de 2025

NEM TANTO AO MAR, NEM TANTO À TERRA!

Cada vez se fala mais se divulga que as boas notas não garantem o sucesso.  A mim preocupa-me este discurso, porque me parece que estamos a cair no risco de uma cultura de laxismo — aquela ideia de que "não preciso me esforçar", "tá tudo bem ser medíocre", ou "não importa o que eu faça". Isso pode ser extremamente prejudicial, ainda mais num momento delicado como o que Portugal (e muitos outros países) atravessam neste momento de crise económica, desemprego jovem, baixos salários, fuga de cérebros…

Mas o ponto central não é este. Quando se diz que “não é preciso ter boas notas para se vingar na vida”, não se está a defender o desleixo ou a preguiça. Está a defender-se algo novo que vale a pena pensar e que é a pluralidade de caminhos.

O nó górdio reside no facto do sistema muitas vezes transmitir uma mensagem: “Se não fores bom aluno, estás lixado.” E isto, simplesmente, não é verdade.

Mas o outro extremo - o do "não preciso estudar nada, a escola não serve pra nada" - também está errado. Talvez o que esteja a preocupar-me, seja o risco de que isto se transforme numa desculpa para não nos esforçarmos.

O equilíbrio, a meu ver, está aqui:

  • Valorizar o esforço, o trabalho, o aprender — seja na escola, num curso técnico, a trabalhar num café ou a montar um negócio.
  • Respeitar diferentes tipos de inteligência e talento, que muitas vezes a escola tradicional não reconhece.
  • Lutar contra a ideia de que só há um modelo de sucesso.

Em Portugal hoje…

Com tantos jovens desmotivados, salários baixos e um ensino que nem sempre conecta com a vida real, é fácil cair na apatia. Mas a solução não é exigir boas notas como única medida de valor, nem dizer que nada importa.

A solução, talvez, seja:

  • Criar uma cultura de esforço com propósito.
  • Mostrar que estudar pode valer a pena, sim — mas que há outras formas válidas de aprender.
  • E, acima de tudo, ensinar os jovens a acreditar que o seu valor não se mede só em números.

 

quinta-feira, 26 de junho de 2025

O Novo Jet Set

Durante boa parte do século XX, o termo "jet set" era usado para descrever uma elite internacional de ricos e famosos, que cruzavam o globo em jatos particulares, frequentando festas exclusivas, resorts de luxo e eventos badalados. Era um grupo reconhecido pelo glamour, pela ostentação e pelo estilo de vida inatingível, muitas vezes imortalizada por revistas e colunas sociais.

Hoje, o "novo jet set" é configurado de forma bastante diferente, mais digital, mais influente e, em certos aspetos, mais acessível (ou, aparentando ser). O novo jet set é composto por uma elite global que não se define apenas pelo dinheiro, mas pelo alcance, pela relevância e pela capacidade de moldar narrativas no mundo digital. Influenciadores, empreendedores de tecnologia, artistas de media, criadores de conteúdos, e até mesmo nómadas digitais com grandes audiências, formam esta nova constelação de poder. Podem não ter heranças milionárias, mas têm seguidores, influência cultural e visibilidade transnacional.

Enquanto o jet set clássico exibia status por meio de consumo e presença em espaços exclusivos, o novo jet set valoriza experiências, liberdade geográfica e capital simbólico. Estão menos nos salões de gala e mais nas conferências globais, em retiros de bem-estar em Bali, ou documentando as suas rotinas em Tóquio, Lisboa ou Dubai. Não é raro que sua vida pareça simultaneamente distante e íntima. As suas viagens são compartilhadas em tempo real, os seus pensamentos estão em podcasts, os seus negócios são discutidos no X (Twitter), e a sua estética molda tendências mundiais via Instagram ou TikTok.

Contudo, essa nova elite também enfrenta críticas. A aparente informalidade e autenticidade mascaram, muitas vezes, estruturas de privilégio e exclusão, similares às do antigo jet set. Além disso, o culto da produtividade, da performance e do "lifestyle" perfeito, podem gerar pressões psicológicas tanto para quem consome como para quem produz essa imagem. A desigualdade continua presente, apenas mais camuflada sob filtros e narrativas de meritocracia digital.

O novo jet set representa, assim, uma transformação no imaginário de sucesso e mobilidade global. É menos sobre luxo explícito e mais sobre acesso simbólico, influência cultural e presença digital. Ainda assim, agora, há uma elite que se mantém, não apenas nas primeiras classes dos aviões, mas nos algoritmos, nas tendências e no imaginário coletivo.

 

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Como a mãe sobrevive à injustiça que não passa

Viver a vida inteira sentindo-se a parte esquecida de uma história familiar — aquela que segurou as pontas, que chorou sozinha, que renunciou a si para proteger os filhos — pode ser devastador. Quando, além disso, os filhos demonstram mais carinho, lealdade ou compreensão ao pai que causou a rutura, o que resta à mãe?

Resta ser fiel a si.

Ser mãe, nesse caso, é um ato de resistência silenciosa. É escolher continuar a amar sem aplauso, cuidar sem reconhecimento, e manter-se íntegra mesmo quando a vida foi injusta. Isto não é passividade — é uma força quase sagrada. E essa força precisa ser cuidada, alimentada, honrada.

A dor não deve ser engolida sozinha. É essencial falar, buscar apoio, terapia, ou simplesmente ter com quem dividir essa ferida. Porque o que dói de verdade não é só o amor negado, mas o silêncio que o envolve.

Também é importante entender que os filhos, muitas vezes, não veem as coisas como os pais veem. Eles lidam com as suas próprias faltas, projeções e idealizações. Às vezes preferem o pai ausente ou irresponsável porque não os cobra, porque representa uma figura mais leve ou livre. Mas isso não significa que a mãe foi menos importante — significa apenas que eles ainda não compreenderam tudo.

O tempo pode não consertar tudo, mas amadurece os olhares. Muitos filhos só enxergam a dimensão do que a mãe fez, quando se tornam pais. Às vezes, nem aí. E mesmo assim, é possível encontrar paz. Não na expectativa do retorno, mas na dignidade do que foi feito.

A mãe que vive essa injustiça precisa, acima de tudo, resgatar a sua própria história além da maternidade. Voltar-se para si: seus desejos, seus projetos, sua identidade, além do cuidado. Porque, embora os filhos sejam parte fundamental da vida, eles não devem ser o único espelho da nossa realização.

Não é justo, não é leve, e talvez nunca seja retribuído. Mas o amor verdadeiro não depende de o outro entender. Ele basta-se por ser inteiro, mesmo quando o outro não enxerga.

 

domingo, 22 de junho de 2025

O Último Degrau


Embora o discurso da igualdade de género tenha avançado bastante nas últimas décadas, um fenómeno persiste ainda e desafia a verdadeira equidade. É a dificuldade em promover mulheres ao topo, mesmo quando elas já ocupam posições de liderança logo abaixo.

É comum encontrar mulheres altamente qualificadas, com histórico de resultados e competências reconhecidas, ocupando cargos de gestão sénior, direção ou vice-presidências. No entanto, quando se trata de dar o passo final - assumir a presidência -, o comando de uma área estratégica ou integrar o último nível, a hesitação aparece. Este último degrau transforma-se numa espécie de teto invisível, não mais baseado na falta de mérito, mas em perceções inconscientes e estruturas enrijecidas.

Esta barreira é diferente do conhecido “teto de vidro”, porque ela afeta mulheres, que já romperam muitas das resistências anteriores. Ela manifesta-se subtilmente- são dúvidas sobre o “perfil de liderança”, receios quanto à “exposição”, ou sobre a “capacidade de lidar com pressão”, ou argumentos velados sobre o “momento certo”, raramente usados com a mesma frequência, ou peso, em relação a homens nas mesmas condições.

A dificuldade em promover mulheres ao último degrau não é, na maioria das vezes, declarada. Ela disfarça-se em processos de decisão opacos, e preferências subjetivas pelos modelos tradicionais de liderança e na perpetuação de estereótipos que associam autoridade e poder a figuras masculinas. O resultado é a manutenção de um topo corporativo homogéneo, mesmo diante de um pipeline de talentos femininos prontos para liderar.

Enfrentar esse desafio exige mais do que políticas de diversidade. Requer coragem institucional para rever critérios de promoção, treinar lideranças conscientes e, sobretudo, vontade real de quebrar o ciclo. Porque quando uma mulher está no penúltimo degrau, o que falta não é competência — é decisão.

Acresce, que a política de bastidores que rege muitas promoções no topo das organizações é um obstáculo estrutural. Em ambientes onde decisões são tomadas com base em alianças informais, lealdades pessoais e trocas de favores, o mérito formal — ainda que essencial — não é o critério determinante.

Nesse jogo, acesso e influência importam tanto quanto competência. E é aí que muitas mulheres ficam em desvantagem: não por falta de habilidade política, mas porque esse sistema de favores frequentemente exclui mulheres dos círculos informais de poder — almoços exclusivos, reuniões fora da agenda, espaços onde as decisões são moldadas antes mesmo de qualquer processo oficial.

Além disso, muitas mulheres tendem a evitar (ou são desencorajadas a participar de) redes que operam com lógicas não explícitas, por questões éticas, culturais ou até por receio de serem mal interpretadas. O resultado? Quando chega a hora da escolha, o nome delas simplesmente não está "circulando" nas conversas certas — mesmo que estejam no degrau imediatamente anterior ao topo.

Portanto, não é só o mérito que está em jogo. É a forma como o poder circula. Se as estruturas decisórias continuam baseadas em relações de favor e conveniência, mulheres continuarão sendo preteridas não por falta de capacidade, mas por estarem fora da engrenagem informal que realmente define quem sobe.

sábado, 21 de junho de 2025

Quanto vale uma Vida?

"Quanto vale uma vida?" Esta pergunta ecoa nos corredores da ética, da justiça, da filosofia e da própria existência humana. Num mundo cada vez mais pautado por números, lucros e métricas de produtividade, essa questão convida-nos a parar e refletir: é possível atribuir um valor à vida humana?

Do ponto de vista biológico, todas as vidas são equivalentes. Porém, na prática, a sociedade muitas vezes atribui pesos diferentes a depender da origem, da classe social, da etnia ou da profissão de uma pessoa. Um executivo pode ser tratado como mais valioso que um morador de rua; um cidadão de um país desenvolvido pode receber mais atenção do que uma criança faminta num lugar esquecido pela mídia.

No entanto, o valor da vida não está na sua utilidade económica, nem na fama, no status ou na contribuição aparente para a sociedade. O valor de uma vida está na sua singularidade, na sua capacidade de sentir, de amar, de aprender, de transformar o mundo à sua volta — por menor que pareça esse impacto.

Durante tragédias, guerras ou pandemias, somos confrontados com esta questão de forma crua. Quantas mortes são necessárias para que a humanidade perceba que cada uma delas é uma perda irreparável? Números podem ser estatísticas, mas por trás de cada número há uma história, uma família, sonhos interrompidos.

Valorizar uma vida significa respeitar a dignidade do outro, defender direitos humanos, lutar por equidade, e reconhecer que nenhuma existência deve ser descartada ou negligenciada. É também uma chamada à empatia, à solidariedade e à construção de um mundo onde todas as vidas importam de fato, e não apenas no discurso.

Porque no fim das contas, o valor de uma vida, talvez não possa ser medido — apenas reconhecido, respeitado e protegido.

 

sexta-feira, 20 de junho de 2025

A IDADE É APENAS UM DETALHE!


Sem saber muito bem porquê, nos últimos tempos, tenho sido frequentemente associada ao conceito de envelhecimento ativo – um tema sem dúvida relevante, e pelo qual me sinto honrada por poder contribuir. No entanto, algo me leva a sentir, que essa faceta da minha vida, começou de repente, a ofuscar outras dimensões do meu percurso profissional, igualmente ricas e, espero, inspiradoras.

Se o interesse no meu percurso existe, talvez valha a pena voltarmos a olhar para a totalidade do que faço e do que sou — para além da idade. Porque continuo a trabalhar, a criar, a pensar, a escrever e a inovar. E é essa continuidade que, no fundo, é o verdadeiro exemplo do envelhecimento ativo: não o tema, mas a ação.

Ficarei muito contente por poder, também, conversar sobre projetos, ideias, experiências e visões que transcendem etiquetas geracionais — e que falam, antes de tudo, daquilo que nos move a todos: a curiosidade, a paixão e o compromisso com o que fazemos.

Por que está em alta o Quiet Quitting?

Nos últimos anos, especialmente após a pandemia de COVID-19, o termo "quiet quitting" (ou "demissão silenciosa", em tradução livre) ganhou destaque nas redes sociais e nos debates sobre saúde mental e cultura corporativa. Apesar do nome, o quiet quitting não significa que o profissional se está a demitir do trabalho. Pelo contrário, ele continua no seu cargo — mas deixa de fazer algo, além do que lhe está formalmente exigido.

Trata-se de uma postura em que o colaborador decide não ir além das suas responsabilidades contratuais, recusando-se a realizar horas extras não remuneradas, assumir tarefas fora da sua função ou comprometer sua saúde mental em nome da produtividade. Em outras palavras, ele faz o que é esperado, sem excessos nem engajamento extra.

Causas do Quiet Quitting

Esse comportamento pode ter várias causas, como:

  • Desgaste emocional e burnout;
  • Falta de reconhecimento ou perspetivas de crescimento;
  • Ambientes de trabalho tóxicos ou exploradores;
  • Busca por equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

Muitos trabalhadores, especialmente da geração Z e dos millennials, passaram a questionar a cultura da “super-entrega” e do “trabalhe como se a empresa fosse sua”, que por vezes valoriza o esforço excessivo sem garantir contrapartidas justas.

Consequências e Debates

O quiet quitting gerou debates acalorados entre líderes empresariais, RHs e estudiosos do trabalho. Para alguns gestores, é um sinal de desmotivação e perda de envolvimento. Para outros, é um ato legítimo de auto-preservação, que convida as empresas a repensarem sua cultura organizacional e o modo como tratam seus talentos. Também levanta uma pergunta importante: esperar que um funcionário "vista a camisa" é justo, ou é uma forma velada de exploração?

Reflexão Final

O quiet quitting não é preguiça. É, sim, um sintoma de algo maior: o desejo de trabalhar com equilíbrio, respeito e propósito. Para lidar com esse fenómeno de forma saudável, as empresas e os profissionais precisam dialogar com transparência, repensar expectativas e promover ambientes mais humanos e sustentáveis.