Perguntaram-me há pouco tempo o que era, para mim, a intimidade.
Respondi que a palavra implicava uma habilidade pessoal para ter coisas em
comum.
Mas fiquei a matutar no assunto e acabei por dar comigo a distinguir
entre “íntimos” e “próximos”, que são conceitos muito diferentes. De facto,
tenho vários próximos – por educação, gosto, admiração – mas íntimos tenho
muito poucos. Talvez mesmo só tenha dois e com um tipo de intimidade diferente
com cada um deles!
A intimidade é um sentimento que se cultiva, que se aprofunda e que em
certos momentos quase se torna como uma espécie de extensão de nós próprios.
É complexo definir intimidade . Ela varia de relação para
relação e pode, inclusive, num mesmo relacionamento, ir tomando aspectos
diversos ao longo do tempo.
Os meus filhos foram e são os meus mais próximos, mas não são os meus
mais íntimos. E, pensando bem, creio que a intimidade, no sentido que lhe
atribuo – a nudez da alma de um face a outro - não deve ser a tónica mais
importante do sentimento que une pais e descendentes. Todavia muitos acreditam
que esse sentimento comporta uma forma de intimidade emocional. Mesmo que assim
seja, a própria natureza da relação pais/filhos impõe certos limites, que levam
a que nenhum dos membros do binómio se desnude inteiramente face ao outro.
Nalgumas famílias o fulcro é, diz-se, a intimidade intelectual, a familiaridade
de interesses comuns. No entanto, aqui, a diferença geracional também pode ser
factor inibitório.
A maior parte das vezes, julga-se que a intimidade está ligada
ao sexo, pelo que o desejo mutuamente satisfeito e os eventuais
sentimentos de afecto daí decorrentes, podem ser confundidos com ela.
Noutros casos a intimidade manifesta-se sob a forma de momentos
partilhados. Porém este tipo de partilha é comum também aos que nos estão
próximos.
Assim, parece-me que a intimidade nasce em primeiro lugar daquilo que
nós estamos dispostos a partilhar com os outros e depois da escolha desses
outros. Ora é na diferenciação deste binómio que irão colocar-se aqueles que
são íntimos e aqueles que são próximos.
HSC
12 comentários:
A intimidade é proporcional ao que nos damos. Gostei imenso.
Sabe, Helena, fica ainda a indisponibilidade terrível para ver ao espelho, forçar um olhar, aproximá-lo se necessário... Íntimo de mim mesmo? Há diálogos difíceis. E essa, sim, é a mais dura das intimidades; mesmo para quem se vê bem na vida.
Não poderia estar mais de acordo! Gostei imenso!
Beijos
Concordo que não é fácil vermo-nos ao espelho. Mas a intimidade vira-me para os outros, não para mim mesma. A essa coisa do espelho chamo mais autoconhecimento. Que por vezes acho uma perda de tempo. Mas pertenço talvez ao número restrito de mulheres que, tanta vez em seu prejuízo, pouco se miram; creio que transporto isso para o autoconhecimento.
Gostei imenso....e identifiquei-me tanto.....
Mas, a intimidade é muito difícil de definir.Acho que é mais para nós próprios. Até me parece que não sou "íntima" de ninguém...nem de marido, nem de filhos.....mesmo porque essa intimidade de que me parece falar, nos deixa demasiado vulneráveis e isso não é lá muito bom.... ;)
Kanoka
É justamente essa vulnerabilidade que impede que, por exemplo, os filhos sejam "intimos".
A relação pais/filhos evita naturalmente a mostra dessa faceta.
A intimidade não será mais do que a alma em todo o seu esplendor que cada um tem dentro de si.Contudo não nos pertence, pois ela é grande intocável e indomável, e sempre que tentamos vê-la uma vez que seja, na tentativa de a contemplar, através de um olhar que pretendemos ser profundo, não vemos mais do que um olhar melancólico e doído pela pena de não o ter conseguido, e que nos vai dizendo para que continuemos na busca de com ela compartilhar algumas das nossas intimidades, que acreditamos que ela entenda.
Bom dia Helena!
Tema interessante, concordo com a sua definição.
No meu caso, só eu me conheço na intimidade, no meu "eu" mais profundo. Hoje já consigo verbalizar com o prof. coisas que numca imaginei, fora disso sou o mais reservada,não me gosto de expor, apesar de já o conseguir mais.
Carla
Para sermos íntimos com alguém, não devemos primeiro procurar ser íntimos connosco mesmo? Pode parecer estranho, mas às vezes fico com a sensação que a mente humana está de tal forma embrulhada, que precisamos de descortinar o nosso ser antes de o partilhar com alguém. Porém, é às vezes na procura de ser-se íntimo com alguém, que nos tornamos (mais) íntimos do nosso próprio íntimo.
Agradeço este tema que, embora de extrema importância, não se vê debatido.
A intimidade é difícil, por isso é evitada por muitos (sem que, em geral, tenham disso consciência) por vários motivos. Pela vulnerabilidade, porque apenas conseguem partilhar com os outros, um estatuto, porque se escudam atrás de uma imagem idealizada através dos objetos de que se rodeiam (por exemplo um automóvel topo de gama, que tem sido associado a uma extensão fálica).
Em geral esta negação de si mesmo e intolerância em relação aos outros, dá origem a jogos psicológicos, o contrário da intimidade.
Intimidade necessita de auto-conhecimento, não faz mal olharmo-nos ao espelho, o que importa é o que fazemos com isso.
A intimidade pode estar completamente ausente da relação sexual, visto que se assim não fosse, a prostituição, seria não só a mais velha profissão do mundo, mas a mais gratificante.
A intimidade é muito diferente de fusão simbiótica (porque tantos suspiram). Esta última não dá origem à intimidade mas à dependência, porque na intimidade existe um paradoxo: duas pessoas fundem-se, mas continuam a ser duas, dando cada uma livre curso à expressão de si mesmo e à sua auto-realização.
A intimidade é uma atitude que se cultiva, uma opção, uma direção, e não um destino.
Na cultura persa existem vários níveis de amor e de amizade, de acordo com o grau de intimidade.
Aashenaa- conhecer alguém
Doost- um amigo próximo
Rafeegh- o melhor amigo
Yaar- o nosso inseparável
Estes graus de relacionamento são contudo independentes de qualquer relação física que se possa ter com alguém.
Podemos ter uma relação apenas platónica com a nossa(o) Yaar, e a nossa mulher/marido pode não ser mais do que o nosso Aashenaa.
O meu Yaar são os livros, a cultura, as artes, alguns autores e pessoas marcantes na minha vida.
Tive o que julguei serem os melhores Rafeegh, mas desiludi-me.
Segundo alguns psis existem várias formas de estruturarmos o tempo.
Necessitamos de o fazer, porque sem estrutura, sentimos o tempo como um vazio existencial.
A intimidade é a mais gratificante forma de estruturarmos o tempo, mas a mais difícil.
A intimidade desenvolve-se às vezes, mas não sempre, entre pais e filhos, entre lovers (casados ou não), entre amigos autênticos e agora...
tcha tcha tchan!!
um aspeto para mim da maior importância, na experiência estética!
NA EXPERÊNCIA ESTÉTICA EXISTE INTIMIDADE
(por exemplo, a relação entre o actor e o público).
Outras formas, segundo os psis, de estruturar o tempo: a actividade (escrever um livro); o passatempo (uma festa); o retiro (o isolamento como escolha temporária); o ritual (oferecer flores, um aperto de mão, etc.); o jogo (vai do mais inofensivo, ao mais destrutivo).
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