Esta questão recente de Fátima Bonifácio, que empolgou o país, acabou por me proporcionar a leitura de muita coisa que me fez pensar.
O caso dos ciganos, de novo retomado, lembrou-me o drama de uma colega que tive e foi marginalizada pelos seus, porque se apaixonou por um homem que não era da sua etnia. Nem calculam o que esta mulher passou.
Do ponto de vista feminino a obrigação de casar com os seus, na adolescência, e numa iliteracia ainda muito grande, dada a pouca simpatia que os pais têm pela actividade escolar das filhas, causa-me algum incómodo.
Como conciliar tradições, que vão contra os nossos costumes, com a integração que todos desejamos porque eles são tão portugueses como qualquer de nós? Angustia-me pensar que algumas daquelas mulheres interiorizaram de tal modo em si aquelas tradições, que as sentem como fazendo parte do seu destino e nem sequer estão interessada em fazer nada para o alterar.
Aquela minha colega sofreu tanto, que quando enviuvou, quis voltar para o seu povo. Mas, entretanto, já tinha tido filhos e filhas que foram para a Universidade e a aconselharam a não o fazer, porque duvidavam que a mãe depois de proscrita, fosse aceite. E muito menos, com filhos que nunca por lá haviam passado.
Como fazer? Como integrar sem aceitar praticas que ferem os nossos princípios? Há quem acredite que é possível. Decerto têm razão. Mas parece-me tão difícil!
HSC
Boa reflexão, HSC! O caso de que fala e mais uns muito poucos, são excepções de um querer muito forte e tb aqui a excepção confirma fortemente a regra!
ResponderEliminarDrª Helena:
ResponderEliminarNunca me hei-de esquecer de uma brevíssima passagem do filme "Out of Africa" (África minha) aparentemente sem importância. Trata-se de um instante em que as personagens principais se cruzam e observam um grupo da tribo guerreira Massai. Estes correm com um propósito que desconhecemos, altivos e belos, mas sobretudo indiferentes aos brancos para quem ostensivamente nem olham, nem sentem qualquer tipo de curiosidade. O nosso mundo não lhes interessa e rejeitam-no. Talvez pressintam que somos uma ameaça à sua Civilização. Julgo que a cena do filme tem como objectivo, precisamente, esse significado simbólico ou metafórico.
Deixem que cada um siga o seu caminho livremente.
Se os ciganos quiserem ser assimilados/integrados devem fá-lo-ão. Mas devem ser eles a sentir essa necessidade de mudança de "moto" próprio. E julgo que acabará lentamente por acontecer, sobretudo entre os mais jovens.
Muitos cumprimentos
LT
Boa tarde,
ResponderEliminarParece-me que a questão não é forçar uma "integração", obrigar a irem contra aquilo em que acreditam.
É tão somente facilitar o acesso aos que pretendem fazê-lo. E de certeza que os há e que se deparam com inúmeras dificuldades no trajecto.
Pequenos passos para grandes mudanças.
Cumprimentos,
Ana
Há uma mulher, a primeira cigana portuguesa advogada, Alcina Faneca, que tem estado em vários programas na tv, e é considerada o rosto da mudança. E várias mulheres ciganas frequentam neste momento a universidade, sobretudo em direito e serviço social. Lembremos que cerca de 1918 licenciou-se em direito a primeira mulher portuguesa- Regina Quintanilha. Há 100 anos, mais ou menos o tempo de vida de uma pessoa. Mas hoje tudo avança muito mais depressa.
ResponderEliminarAinda não há muito tempo, a mulher portuguesa só podia viajar com autorização do marido, não tinha direito a votar, e não frequentava a universidade, porque se achava que o seu lugar era em casa. Ainda não há muito tempo existia na sociedade portuguesa o tabu da virgindade, e os lençóis da noite de núpcias eram pendurados à janela, para que todos pudessem confirmar.
A sociedade portuguesa é machista e classista, mas existe um manto de invisibilidade que nega os problemas e não permite encontrar soluções. Só quando as mulheres começam a cair mortas, vítimas de violência doméstica, é que se começa a levantar a ponta desse véu.Temos motivos para entrar em delírios de superioridade como MFB? Outras sociedades poderão entrar em delírios de superioridade em relação a nós, e isto não teria fim. Penso que só teremos alguma qualidade se soubermos apoiar os portugueses mais fragilizados a encontrarem as suas soluções.
Se não acreditamos na possibilidade de mudança para a comunidade cigana, também não acreditamos que existem soluções para os difíceis problemas da sociedade portuguesa. A aposta para todos está na EDUCAÇÃO.
Há um efeito gato preto na discriminação. O pobre bichano tem sofrido através dos tempos os mais cruéis maus-tratos, devido à crendice de que dá azar. Miau
ResponderEliminarNo seu trabalho solitário de biblioteca, com o nariz sempre enfiado em livros e papeladas, FB afunilou nas suas áreas de competência, isolou-se, alienou-se da realidade do nosso tempo, e ficou parada num tempo salazarento. Os conhecimentos de cada um de nós não estão todos ao mesmo nível. Podemos ter desenvolvido um saber numa determinada área e noutras estar a um nível de saber muito primário ou mesmo errado. Há quem diga que os erros no texto de FB são tão gritantes que só podem ser propositados, para ecoar com a ignorância, a deturpação e a falsa notícia da net, e captar fãs. Há quem diga que está farta de estar só, dedicada à livralhada, farta dos conhecimentos especializados que muito poucos lêem, e quer agitação, polémica, mediatismo. Mais parece um caso de alienação por isolamento.
ResponderEliminarAnonimo das 15:19
ResponderEliminarPertenço a esse grupo de mulheres que carecia de autorização do marido para trabalhar, para agregar os filhos no passaporte, que não teve férias de maternidade, que não poude amamentar porque na função publica, onde trabalhava, esses direitos não existiam.
Só a sorte de ter tido como chefe uma mulher extraordinária, a Dra Etelvina Valente, me salvou de desistir. E também a minha mãe.
Mas paguei bastante caro as minhas ousadias e quando olho para trás sei que repitiria tudo outra vez. Levei seis décadas a ser o que sou hoje, porque ousei contestar autoridades sucessivas. E quem não poude ou não conseguiu? Quem devolve esses anos?
Mas estas eram questões pessoais e muitas mulheres com a minha idade têm, ainda hoje, dificuldade em entender porque trabalho e porque quero viver dele.
O que me incomoda é a "aceitação" dum destino traçado à partida. Os exemplos que dá são reais. Mas o que eu dei também é. E os filhos desta minha amiga recusam-se a aceitar certas tradições. Por isso se sentem num nimbo social. Sabem que são ciganos mas recusam-se a praticar os ritos. E sofrem, claro, com isso.
Se não é de inserção que se trata, como diz, então como se vão gerir as cedências? Consentir no casamento e gravidezes com 14 anos? Como conseguir, sem ferir, que o estatuto das mulheres seja diferente? Ou dar liberdade para uns viverem de um modo que fere as nossa conviccções?
Espero sinceramente que daqui a 50 anos tudo possa ser muito diferente. Mas... e quem vive agora a sua historia?
HSC sou o anónimo das 15h19. Deve haver um mal-entendido, eu não disse que não deveria haver integração. Considero-a uma mulher extraordinária que atravessou várias décadas com a sua coragem e inteligência e tenho pena de não a ver mais nos media. Acho que as figuras públicas femininas com quem as mulheres se podem identificar, são muito importantes. Acho-a um exemplo de abertura e liberdade de pensamento, por isso venho ao seu blog!
ResponderEliminarPenso que os ciganos são abrangidos pelo Código Civil Português, mas muitos casos não chegam às autoridades, por medo, por pressão social, as vítimas não fazem queixa, como acontece com as vítimas em geral. Mas, mesmo assim, existem muitas queixas na polícia, por exemplo, de rapto de raparigas ciganas por famílias ciganas, de casamento forçado, etc.
ResponderEliminarNo séc.XIX, o Código Civil Port. estabelecia a idade nupcial de 14 anos (rapaz) e 12 anos (rapariga). Em 1932, o Código definia 16 anos (rapaz), 14 anos (rapariga) e a reforma de 1977, fixou a idade nupcial em 16 anos para ambos. Maioridade (18 anos) e idade nupcial não são a mesma coisa, não sei sei se actualmente coincidem no Código Port. Em muitos locais do mundo continua a existir o flagelo do casamento infantil, dote e compra de noiva, escravatura.
Mas existem mudanças na comunidade cigana. A estrutura familiar em todo o mundo tem-se alterado muito nos últimos tempos. Entre os ciganos é habitual hoje o casamento por fuga: um par que se gosta desaparece por uns dias e deste modo a comunidade vai considerar o casamento como consumado entre eles.
Consta que há um número mais elevado de ciganos com cursos superiores, mas que optaram por não revelar que são ciganos.
ResponderEliminarConfiemos, pois, na evolução dos costumes que é o caminho seguro e cientificamente comprovado pela História da Humamanidade. E, enquanto isso, saibamos respeitar o Outro.
ResponderEliminarLT
A idade mínima para o casamento em Portugal é de 16 anos. Mas como são menores, têm menos de 18 anos, é necessária a autorização dos pais ou de quem desempenha esse papel.
ResponderEliminarNão esqueçamos que a nobreza e a sociedade portuguesa em geral, casavam as filhas adolescentes. Hoje as jovens ciganas, tanto pelo aumento da escolaridade, como pela influência dos costumes da sociedade port. e dos media (o modo como são tratados nos media os casos de violência doméstica, de violação, de abusos, etc) não aceitam o casamento infantil, muito menos os crimes de violação, etc. Afirmam querer manter a identidade cigana, mas referem-se às tradições- música, danças (outras que nem conhecemos) ao respeito pelos mais velhos, à chamada «honra» da mulher cigana. Os ciganos mais velhos, maioritariamente analfabetos, resistem à influência da soc. portuguesa, e há miúdas que querem casar para se libertarem da pressão, da repressão da família. Tal como nós afirmamos gostar da cultura portuguesa, e estamos a falar das coisas boas, não da violência doméstica, da pedofilia, da tourada (alguns estão), etc. Há pouco tempo houve um desfile de moda cigana, de uma estilista cigana húngara, apresentado por Fernanda Serrano.
ResponderEliminarO que se passa com os ciganos mais antigos, é mais uma rejeição dos costumes actuais, mais modernos digamos, do que uma clivagem entre hábitos ciganos e hábitos portugueses. Casamento infantil, desonra por perda de virgindade, domínio masculino, pouca escolaridade da mulher, pobreza, etc. existiam igualmente na sociedade portuguesa. O conceito de criança não tem sido o mesmo através dos tempos, tal como o de casamento, o papel da mulher, a noção de família.
ResponderEliminarÓ Dona Helena, se em 500 anos não se integraram, vão-se integrar quando? O que me mete mais asco e me causa, confesso, algum receio é esta censura cada vez mais feroz que nos oprime e não permite a ninguém dizer o que pensa ou até o que toda a gente sabe que é verdade.
ResponderEliminar