segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Portugal a arder

Devia já ter abordado este tema. Mas no que respeita a fogos, tenho um traumatismo que me bloqueia se me não impuser a mim própria. Explico-me.
Deveria ter uns dez anos, quando a casa paterna, em plena Baixa lisboeta, foi repasto de um curto circuito, na ausência de todos nós. A imagem do retorno a uma habitação negra de fumo e muito destruída, acompanhou-me durante anos e condicionou, em muito, o meu desejo de viajar.
Já mulher e acabada de divorciar - felizmente os meus filhos estavam no Alentejo -, uma empregada minha resolveu reforçar o aquecedor, aceso, do seu quarto, com petróleo. Não vos descrevo o sangue frio que tive, para isolar a dispensa, onde se guardavam duas bilhas de gaz. Perdi todo o meu enxoval, toda a roupa pessoal e parte significativa do mobiliário. 
No dia seguinte tinha o exame médico de admissão no Banco de Portugal, onde apareci de kilt e meias de lã, que era a roupa que trazia no corpo. Valeu-me a compreensão imensa do médico que estranhou a minha tensão arterial elevada e me perguntou se, na véspera, tivera alguma emoção ou comera algo salgado. Abençoado seja pela qualidade humana então manifestada.
Parti do zero. Em tudo. Na vida afectiva perdera o marido, na vida doméstica perdera o recheio da casa, na vida profissional começava uma rota inteiramente nova. E os filhos, pequenos, choravam os brinquedos desfeitos. Sobrevivi, mas o temor das chamas permaneceu para toda a vida. Muito mais forte.
Chego ao que, agora, interessa. O abnegado trabalho dos bombeiros e a indesculpável incúria, pública e privada, na limpeza dos matagais. Este ano já perdemos três seres humanos, um deles, uma mulher. Acredito que a maioria dos pirómanos seja doente. Mas sei que há os que trabalham por conta de outrem, a quem muito convém o solo ardido. Para estes, a justiça deveria ser exemplar. E para os que não limpam as suas matas, também.
Saiba, ao menos, o governo ser justo a recompensar aqueles que ficaram sem os seus entes queridos!

HSC 

12 comentários:

  1. Helena

    Partilho o seu sentimento por aqueles que ficaram sem os seus entes queridos devido ao flagelo que se passa todos os anos, o nosso país a arder.
    Agradeço a partilha do seu caso e consigo perceber o que lhe vai na alma, deve ser horrível perdermos tudo o que temos e temos que começar do zero.
    Um bem haja para si,

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  2. São grandes perdas, indubitavelmente e escusadas.
    Não percebo, não consigo perceber como é que alguém consegue provocar incêndios florestais (de certeza que nunca fizeram um piquenique e desfrutaram do prazer que o ar puro nos proporciona).

    Paz às almas dos bombeiros que deram as suas vidas, este ano mas também nos anteriores.

    Um beijinho
    Vânia Baptista

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  3. Cara Drª Helena

    Numa propriedade que tenho no interior do país , rodeada por todos os lados de estradas asfaltadas e longe de quaquer pinhal (portanto com riscos diminutos), gasto tempo e dinheiro todos os meses a limpar os terrenos com ervas .
    E depois vejo ali à volta casas junto ao pinhal e em estradas estreitas de terra batida com matagal até à porta .

    Costumo chamar a atenção para o perigo a esses vizinhos e as respostas deixam-me as mais das vezes boquiaberto , até porque não vêm de gente com dificuldades .

    A incúria pública é muita mas a privada não o é menos , para mais vindo das 1ªs vítimas potenciais destas coisas .

    É o tão nosso "não há azar!" .

    RuiMG

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  4. O fogo é uma verdadeira tragédia, nem consigo imaginar pelo que passou!
    Vida cheia de pedras tem sido a sua!
    Este país deixa que continuem impunes quem tem culpas a começar pelo governo! Tem sido cruel para os ficam sem vida assim como para os que sem nada ficam!
    Muitos beijinhos, lb/zia

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  5. Inteiramente de acordo e muito mais poderia ser feito...mas todos os anos é este pânico!

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  6. O cheiro a incendio que se sente no ar durante o verão faz-me tremer. Nunca gostei de festas e romarias das aldeias no verão por causa dos foguetes que sempre acabavam em fogos. Agora acontecem porque alguém os encomenda. Um crime.
    Ajudem os bombeiros e castiguem os culpados
    maria isabel

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  7. Há precisamente um ano atrás, no local onde habito (entre o Guincho e o Cabo da Roca) eclodiu um fogo (posto, criminoso, visto a PJ no dia seguinte ter ali aparecido para proceder a investigações) de proporções suficientes para que tivessem sido necessários cerca de uma centena de bombeiros e inúmeras viaturas daquelas corporações. Entre os bombeiros que ali estiveram, abnegadamente a lutar e a combater o fogo, até perto das 6 horas da manhã (o fogo iniciou-se ás 22.30), estava a jovem bombeira falecida recentemente. Com quem alguns de nós, residentes desta localidade, falámos, juntamente com alguns dos seus companheiros voluntários. A vida ás vezes tem destas coincidências amargas e tristes. É com fundo pesar que hoje penso nisto. Mas a vida é assim. Madrasta tantas vezes.
    P.Rufino

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  8. Olá,

    Estes incêndios causam-me muita angústia e revolta.

    Angústia, porque não consigo deixar de pensar na Natureza que é deliberadamente destruída (embora a mesma possa renascer das cinzas), os bens destruídos, economias de vida arrasadas, Vidas brutalmente perdidas.

    Revolta, porque se insiste em apontar o dedo aos factores menores, embora importantes, mas menores: calor vs baixa humidade, limpeza das matas e pirómanos com um perfil específico!

    A limpeza das matas é imprescindível, mas nalgumas áreas quase impossível. Talvez fosse mais importante criar vias, sinalizá-las por uma questão de orientação e mantê-las limpas, para que permitisse acessos rápidos no combate ao fogo. Encurtar as distâncias entre os pontos de observação, para agilizar o processo de detecção e identificação. Criar patrulhas com as polícias municipais. Profissionalizar os bombeiros. Bem haja os voluntários, mas estes deveriam ser os últimos a chegar, não os primeiros. Penalizar os causadores dos fogos, não só quem ateia, mas também quem mandou atear. E, por fim, as matas ardidas, privadas ou públicas, como consequência de prova de fogo posto (identificado ou não o causador), deveriam ser “julgadas” a reflorestação obrigatória (de árvores naturais da área geográfica) durante 20 anos, sendo proibida a venda, a construção ou a transformação mesmo em outro tipo de terreno.

    Talvez assim os fogos começassem a diminuir.

    Cumprimentos,
    Cláudia







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  9. Ontem à noite, ouvi num dos canais da TV, no telejornal, que bem perto dos grandes incêndios que estão ativos no norte do País, festejava-se uma romaria anual, com os respetivos foguetes como que se nada estivesse a acontecer. Em face desta ignorância, o que podemos dizer e pensar?...

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  10. Anónimo das 15:33
    Também eu vi e tive a mesma reacção. Mas se neste momento tivessem proibido o fogo de artifício, já pensou no que diriam?!
    É-se morto por ter cão e por não ter...

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  11. Caros comentadores
    Aprendi ao longo da vida a não julgar ninguém.
    Posso discordar, combater, influenciar, dizer o que penso.
    E fico por aí. Não sei odiar.
    E, desculpem-me, sinto nalguns comentários, um juízo de carácter, que me deixa impressionada num momento como este.
    Se cada um de nós fosse julgado da mesma forma, alguém escaparia?
    Esta sociedade justicialista que se está a desenvolver, deixa-me aterrada, confesso!

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  12. gostaria de ver umas visitas do presidente e do primeiro ministro a algumas frentes dos incendios, ali bem ao lado dos bombeiros, com as chamas perto, gostava de os ver interromper as ferias, sim gostava de ver essa solidariedade com as populações sofredoras, os bombeiros esgotados e feridos e falecidos, pena pelas florestas portuguesas expressas nos locais por essas altas personalidades, etc etc

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