Quando era pequena atravessei uma guerra, na qual não entrámos, mas cujas consequências sofremos. Trata-se, como é evidente da 2ª Guerra Mundial. Só anos mais tarde compreendi o que era a minha vida nessa altura: simulacros aéreos, tiras de papel a segurar os vidros e as famosas senhas racionamento em que cada família tinha de mostrar a sua composição. Assim, tive muitas vezes de aguardar horas em filas de abastecimento com a minha caderneta, para evitar os abusos. Porém, aquilo que relembro de forma mais nítida, eram as sirenes para que aprendêssemos a procurar refugio próximo.
A minha família não era o que se pudesse dizer rica, mas vivíamos felizmente todos bem e, como era hábito no tempo, todos habitávamos perto da casa dos avós maternos e, alguns mesmo, ainda dentro dela, porque o clã era numeroso e os filhos eram muitos. Ao Domingo era sagrado o almoço familiar e a lembrança que guardo é que todos juntos éramos algo indestrutível, pese embora a variedade de posições politicas dos seus membros.
Foi aqui, com estes avós que aprendi tudo o que era importante saber, ou seja, o que era o verdadeiro amor. A serenidade que possuo perante dores profundas, foi aprendida neste núcleo familiar, comandado e corporizado na figura da minha doce e segura avó Joana, que eu venerava.
Quando, agora, olho para o espetáculo de uma guerra espetáculo, em que o dizimar de cidades se alterna com visitas presidenciais e ministeriais aos locais onde ela decorre, vêm-me à memória os outros tempos, em que as despedidas se faziam nos cais de embarque e as noticias eram dadas, muito espaçadamente, na radio ou por cabogramas.
Com efeito, mudámos muito. Hoje a história do martírio vai sendo contada ao sabor da televisão e do enquadramento politico, com dezenas de comentadores, militares ou civis, que surgiram, de repente, não se sabe bem de onde, e que para ajudar, fazem as mais variadas interpretações sobre a eventual evolução do conflito. Tal como a Maya faz com os signos do Zodíaco.
E eu, no fundo, penso diariamente, na fome que se mataria em África ou noutras partes recônditas do mundo, com os milhões e milhões de dólares e euros gastos nesta guerra, em que todos vamos ficar vencidos e muito mais pobres do que já éramos. E, possivelmente, sem conseguirmos estancar este suicídio coletivo!
HSC
Concordo com tudo o que diz, sou da mesma opinião
ResponderEliminarMais pobres de espírito já estamos.
ResponderEliminarTodos.
A seguir vamos pagar, literalmente, o preço desta guerra que um louco russo decidiu começar e que ninguém poderá como e quando vai acabar.
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Lembrei-me de quando era pequena ouvir da minha avó e de meus pais os relatos sobre as 1ª e 2ª Guerras Mundiais. Considerava-os uns heróis. A avó no Porto e os pais numa aldeia da Beira Alta sofreram os mesmos vidros selados e as senhas de racionamento 50 anos depois de os ouvir mal diria eu que assistiria a outra guerra não menos cruel, talvez mais sofisticada.
ResponderEliminarIncrédula e horrorizada pergunto-me como é possível cometer tais atrocidades no sec. XXI
Lembrei-me de quando era pequena ouvir emocionada os relatos da minha avó e de meus pais sobre os tempos difíceis que viveram durante as 1ª e 2ª Guerras Mundiais. Olhava para eles como verdadeiros heróis porque quer a avó no Porto ou os pais numa aldeia na Beira Alta tiveram de sofrer os mesmos vidros selados por causa de eventuais bombardeamentos ou as mesmas senhas de racionamento. Mal diria eu que 50 anos depois de os ouvir iria assistir a atrocidades mais sofisticadas que me deixam horrorizada e mesmo incrédula. Como é possível em pleno séc. XXI tamanha barbaridade?
ResponderEliminar🌷
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