terça-feira, 4 de novembro de 2014

Irmãos


Nunca soube explicar os diferentes tipos de amor familiar. Nem sequer sei porque é diferente o amor que sinto pelos meus dois irmãos, um mais velho, outro mais novo.
Talvez pudesse dizer que me fiz com o mais velho e que terei ajudado a fazer o mais novo. Mas será que isto explica alguma coisa? Creio que não. E, no entanto, é bem capaz de ser razão fundamental dessa diferença.
Com o mais velho une-nos um humor muito nosso que começava - ia escrever começa, mas ele está tão doente que o tempo do verbo já não seria correcto - primeiro por um silêncio cheio do gosto de nos vermos, para depois explodir no abraço forte e já pleno de risota. Os outros desapareciam e nós ficávamos horas a fio a desfiar rosários da política, do cinema, dos livros e dos discos. Tinhamos gostos comuns e um amor à prova de bala, que nem uma carreira diplomática passada no estrangeiro conseguiu, alguma vez, diminuir. Eram anos e anos derramados em poucas horas e um profundo interesse pelo mundo um do outro.
Com o mais novo, que nasceu quando eu tinha dezoito anos, o que nos liga é misto de amor de mãe e de irmão. A primeira vez que o vi era um bebé rochunchudo que adorava passear comigo de mão dada. Hoje, engenheiro, homem bem sucedido, o que mais nos une é uma imensa ternura que nos faz ficar semi adormecidos no mesmo sofá quando já todo o mundo está na cama. A família ri-se de nós, mas eu recordo esses bocados como pedaços de céu na terra. 
Entre o meu filho Miguel e este tio havia oito anos de diferença. Ele foi o passaporte de que o sobrinho carecia para tudo o que eram concertos, cinema, fotografias e escapadas. Ir com o tio impedia-me de dizer "não".
Agora que tenho um doente e o outro em África, sinto sempre que me falta algo. Um, vai e vem. Mas o outro já dificilmente virá. É isso que, por vezes, me entristece. Embora saiba que é a vida!

HSC

17 comentários:

Fatima MP disse...

É a vida mesmo, Helena. Muito bonito!
Abraço!
Fatima MP

Fatyly disse...

Compreendo o que diz, eu própria também por vezes paro a pensar no mesmo, o que me leva a ter uma ligação tão forte com o meu irmão a seguir a mim, temos um anos de diferença e uma distância tão grande da minha irmã mais velha? Com a mais nova é quase um sentimento idêntico ao que sente pela diferença de idades- mãe/irmã. Penso nisso tantas vezes e pensava só eu sentia isso, quando ouço falar sobre irmãos.
O outro mais novo, o nosso João, morreu pertinho dos 21 anos ainda em Luanda e esse sim, refugiava-se em mim e como dizia tantas vezes eu era o seu escudo invisível.

Todos vindo do mesmo pai e da mesma mãe, todos com a mesma educação e entre os irmãos há diferenças tão grandes em termos de ligação.

Boa reflexão e ufa...clarifiquei mais as ideias. Obrigado

Anónimo disse...


Bonita, a sua relação com os seus irmãos, o mais novo é da mesma idade da minha mãe.
Não têm irmãs?
Gostava de ter tido uma irmã, penso que teríamos mais cumplicidade.
Tenho 3 anos de diferença do meu irmão, também é engenheiro, temos uma boa relação, apesar de sermos totalmente diferentes.
Ele aventureiro, activista, naturalista, anti-rotinas, eu o oposto, apesar das diferências, dos 5 mil Km que nos separam, é com ele que desabafo, é a ele que peço conselhos. São sempre dados com toda a sua sabedoria, que nestes últimos 4 anos foi ficando mais refinada, a vida, um desgosto amoroso fez com que ele, desperta-se para outros sentidos, para mim melhores!

Que diz, dos nossos juízes serem expulsos de Timor?
Aqui há gato...

Carla

Anónimo disse...

Parece ter uma gralha na palavra "bebé", uma vez que nenhuma palavra portuguesa tem mais de um acento. ;)

Silenciosamente ouvindo... disse...

É a vida, mas é sofrimento!!!
Lamento mais um porque passa!
Bj.
Irene Alves

Dinada disse...

Helena Sacadura Cabral eu, filha do meio de irmão mais velho uma ano e mana mais nova dois anos, sinto que vivi (vivo) a fraternidade duma forma muito deiferente sa sua. Há uma "sínrome do irmão do meio", que há. No nosso caso existe uma diferença - não de somenos importância - que consiste no facto de ser a única rapariga. No meu caso, sendo a do meio de ambos os sexos, fiquei mais perdida. Nunca por falta de amor parental, sempre sempre muito presente, posso gabar-me duma infância e seguinte percurso até à minha indepência muito muito feliz, com tudo o que qualquer criança merece mas em triplo, talvez...ou até mais. Para perceber melhor ia com os manos à Ópera no S. Carlos todas as temporadas, que os meus queridos pais tinham lá lugar cativo para toda a família. E os Domingos de manhã eram passados, invariavelmente, a ouvir a música clássica com o Maestro José Atalaya, estes especiais para crianças (sortuda), aprendi piano, viola, solfejo e Canto Gregoriano durante 4 anos e cheuguei a ser solista. Acho que dá para perceber a privilegiada que fui. Quanto ao tema que dá título ao post fica uma mágoa: amo muito os meus manos, muito...mas, e há sempre um raio dum mas, sinto que o mais velho me foge das mãos, por mágoas comuns, muitas com razão de ser mas que, no fim do dia, durmo mal a pensar: e se lhe acontece qualquer coisa? e se a reconciliação aparece tarde...

Este escrito da Helena serviu-me como um capuz que me assentou como uma luva.

E, acredite, se ter um blogue lhe dá satisfação, que calculo lhê dê, saiba que HOJE fez realmente a diferença na vida duma Dinada qualquer, que a lê e que não vai adiar o beijo fraterno há muito desejado.

Deixo-lhe um abraço, apretadinho!

P.S. Havia de ponderar por ali um endereço de e-mail. é que pouparia os seus leitores a estas lamechices que sei despropositadas, com um pedido de desculpa a quem a lê (é saltar à frente..."fáxavôre")

Anónimo disse...

Cara dra
Já vou ouvindo dizer : "Se calhar,afinal os submarinos foram bem comprados"
Isto a propósito das "visitas"dos russos a Portugal.
Ah pois é! Já dizia o meu avózinho: " Em tempo de guerra,não se limpam armas."

Irmãos assim,são uma benção.Bem hajam!

J Guerra



Helena Sacadura Cabral disse...

Dinalda
Sigo fielmente um critério "não morras com uma palavra por dizer, nem um gesto por fazer!".
A doçura faz bem à vida. Vá dar esse beijo, mesmo que nada receba em troca. Alguém lá em cima registará!

Clarisse Castro disse...

Cara Helena,

Quando os pais faltam é nos irmãos que os revejo.
Presentes nos detalhes, características e afectos que me aconchegam a alma.
Um abraço solidário

bea disse...

Como a entendo. Tenho três irmãos e com cada um o amor faz diferença. À medida que envelheço penso na morte a separar-nos fisicamente.E tenho a esperança secreta de que a ordem natural seja respeitada. São quase como meus filhos, o mais novo sobretudo. E o tempo que passo com eles voa. O que me pergunto é se será igual o que sentem. Talvez não. Mas tenho certeza de que é um amor que faz falta a todos nós. Tenho muita pena de quem não tem irmãos.

Anónimo disse...

Com grande pena minha não tenho irmãos nem cunhados nem nunca serei tia, facto que me entristece muito.
Tenho um leque alargado de tios tias primos e primas. Alguns primo considero irmãos, mas não deve ser a mesma coisa.
Lamento a doença do seu irmão mais velho e peço a Deus que cuide dele e o ajude no seu sofrimento.
Beijinho
FL

Anónimo disse...


Bom dia Helena!

"não morras com uma palavra por dizer, nem um gesto por fazer!".

Sempre seguiu esse critério, a vida toda?
Ou foram as circunstâncias da vida, que a transformaram?

Infelizmente, nos meus 40 anos de vida, ficaram muitas coisas por dizer/fazer, nem sabe como vivi arrependida, com culpabilidade...
Hoje com 42, aprendi a sentir menos esses sintomas, aprendi a dizer o que penso, a fazer o que quero.
Mas sou sincêra, já tive muitos dissabores, por passar a ser como sou agora.
Quando, tenho que criticar critico ( ninguem gosta ), aprendi a pedir desculpa, a dizer gosto, não me importo nada se as pessoas têm ou não empatia por mim, sou simplesmente eu, sem máscaras...
Enfim esta minha transformação, foi positiva para mim, mas má para outras pessoas...
Sabe, sou como o Sr.Henrique tenho o coração na boca...mas no fundo, tenho um coração de manteiga.
Agradeço-lhe por me ler,por me dar oportunidade aos meus devaneios, escrever o que sinto é a minha catarse, a decarga.
Hoje, vou aprender mais um pouco, 45 minutos só meus...
Sem a conhecer pessoalmente, já nutro por si um carinho especial, não estou, nem quero bajular...

Carla

ERA UMA VEZ disse...

Como dar esse beijo de perdão a quem orgulhosamente não reconhece o erro e não se arrepende de todo o mal que provocou,que alimentou e da tristeza que a mãe, receosa e dividida levou na partida?

Como dar esse beijo não desejado a quem por soberba afastou sobrinhos e seus rebentos?

Como forçar esse gesto se ele ficará pairando nos dias "soando a falso"?

Abraço querida Helena.
Que bom ter dois irmãos a quem amar. Eu só tenho uma, a minha Carmo que partiu antes do tempo, já lá vão sete anos. Curiosamente é com ela que converso e sei que me entende.

Contradições da vida...

Helena Sacadura Cabral disse...

Anónimo das 16:04
Não é verdade.A palavra órfão tem dois acentos.
Mas obrigada na mesma!

Helena Sacadura Cabral disse...

Bea
Não é preciso que seja igual o que sentem. Basta que "sintam"!

Helena Sacadura Cabral disse...

Carla
Tento segui-lo desde que me tornei gente. Mas pode-se dizer o que se pensa de multiplas maneira. Escolho sempre as que julgo que magoam menos. Nem sempre consigo, mas a minha consciência - é dela que se trata - fica tranquila!

Anónimo disse...


Bom dia Helena!
Segundo li no seu livro, teve a sorte de ter uma ferramenta muito importante, para seguir esse critério, " A Sua Mãe ".
Eu, comecei muito tarde só depois de ser ajudada pelo profissional, depois de perder um pilar na minha vida.
Ainda sou caloira, tenho que me aperfeiçoar de dizer o que se pensa, da forma menos dura,este processo é lento, mas espero chegar lá.
O que disse, acima foi-me dito ontem nos meus 45 minutos alías ontem foram mais, e produtivos.
Ontem tive a sorte, de ter 2 pessoas diferentes, com a mesma opinião :), ambas ajudaram-me a clarificar as minhas ideias.
Obrigada!!
Vai gostar, aos 16 minutos :)

Il Divo Mamã
https://www.youtube.com/watch?v=J-Plugc0kk8&list=UUb90aU-AbEsBHSzj1-xhaww

Carla