quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Miró por um canudo


De acordo com o que leio nos jornais, o acórdão de um Tribunal declara que a saída de um conjunto de obras de Miró foi "manifestamente ilegal". 
E acrescenta "não ser necessário argumentação sofisticada para concluir que a realização do leilão pela leiloeira Christie's das obras de Joan Miró comprometeria gravemente o cumprimento dos deveres impostos" pela Lei de Bases do Património "e reduziria a nada a concretização dos deveres de protecção do património cultural". 
A decisão do presidente do Conselho de Administração da Parvalorem - sociedade criada no âmbito do Ministério das Finanças para recuperar créditos do BPN e que é proprietária das obras, assenta seguramente não no valor cultural e artístico de tais obras, mas sim na expressão pecuniária que elas representam.
Para quem considere que os economistas são meros escribas contabilísticos a operação de venda deste património já nem surpreende. É uma visão economicista da classe, que pessoalmente lamento - porque nem todos somos iguais ou destituídos de um enquadramento cultural – mas no caso concreto ela corresponde à realidade.
Mais surpreendente será a posição do secretário de Estado da Cultura. Com efeito, após atirar para o Governo anterior as culpas do País ter "herdado", contra vontade, uma colecção de excepção, ainda se permitiu, indagado sobre a ilegalidade do seu despacho de  autorização de saída das obras, perguntar se "seria normal que por causa de uma questão deste género eu pondere a demissão?".
Não menos surpreendente, convenhamos, é o facto de um juiz se declarar incompetente para julgar e, mesmo assim, produzir uma "sentença". Acaso isto é "normal" ou, digamos, mesmo "legal"?
No meio de tudo isto, uma nota cómica para desanuviar. Será que a colecção é mesmo autêntica?! Há alguma garantia disso? É que no caso BPN temos que admitir todas as hipóteses...

HSC

16 comentários:

Maria Porto disse...

Que me desculpem, (não sou insensível à cultura e até acho que um país e o seu povo fica mais pobre com a pouca importância dada à cultura em todos os seus aspectos) mas neste momento não estou interessada nos "Mirós"!
Enquanto a minha filha e o meu genro estão desempregados sem qualquer tipo de subsídios, licenciados numa Universidade Pública, com notas boas, com um Master Executive posterior, enquanto me continuarem a tirar, impunemente, à minha reforma de funcionária pública, não estou disposta a pagar esses quadros com o meu dinheiro! Pronto! Estou farta!
As minhas prioridades e de muitos portugueses são outras! Pôr comida na mesa para todos.
Cumprimentos

Paulo Abreu e Lima disse...

Sou totalmente contra a venda daquele património, como o aproveitamento político à volta da questão. Acho completamente idiota que a esquerda se arrogue como única defensora do bem cultural comum, como pensar que a direita liberal (ou lá o que seja) é destituída da valorização de bens culturais. Um absurdo. Quanto à sentença, nunca tanto como agora, os juízes são tentados a tecer as mais elaboradas considerações laterais à própria. Uma espécie de cartilha de boas condutas de gestão política. Resumindo, não são umas poucas dezenas de milhões que iriam tapar buracos de milhares de milhões, para usar precisamente linguagem de merceeiro. Até porque o valor cultural não é tangível nem se resume a vendas e a valores forçados.

Deliciosa a ironia na parte final: para quem falsificou tanta coisa é avisado que se averigue a autenticidade do acervo Miró :-)

Helena Sacadura Cabral disse...

Maria Porto
Se vendermos a colecção o dinheiro entra e nunca se sabe para onde vai. Nem se alguma vez chegará para minorar problemas como os seus.
Se a expusermos, poderemos rentabilizar a sua posse e mantemos um património valioso.
Mas compreendo que, na actual situação de crise, isso seja o que menos lhe interesse.

Alcipe disse...

Se eu não estiver interessado no colar de ouro da minha avó, vendo-o logo pela primeira oferta que o joalheiro me fizer?

maria isabel disse...

Já nada me admira porque já ouvi o seguinte: Não sabia da existência desses Paineis de S.Vicente que estão no Museu de arte antiga.Se são assim tão valiosos,porque não se vendem?
Nem comentei,porque quem o disse era uma pessoa bastante IMPORTANTE.

Helena Sacadura Cabral disse...

Meu querido Alcipe
Sou frontalmente contra a venda desta colecção.
E mesmo que estivesse muito aflita, nunca me desfaria de algo que fosse da minha avó e tivesse vindo parar às minhas mãos.
Apenas o faria, dolorosamente, se os meus filhos passassem fome.
Mas estes decisores, infelizmente, são capazes de nem saber quem é ou foi Joan Miró...

Helena Sacadura Cabral disse...

Meu caro Paulo
A esquerda sabe tudo, conhece tudo, e tem o monopólio da cultura e do bem fazer.
Já vivi isto, há muitos anos, quando essa esquerda intelectual e progressista me apelidava de reaccionária.
Entretanto, esses foram-se tornando gestores "socialistas" do publico e do privado, como Pina Moura, por exemplo. É a vida ...e a falta de memória!

Fatyly disse...

Embora não aprecie sei bem quem foi o Joan Miró...e com isso vejo um pouco mais do buraco do BPN.
Actualmente e na miséria/abandono a que fomos votados por governos "sem adjectivo" é caso para dizer: Casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão.

Para terminar dei uma gargalhada com a sua "nota cómica"...nunca se sabe, nunca se sabe:)

Blondewithaphd disse...

Já nada me surpreende...
(nem a falta de sentido cultural, nem o economicismo à bruta, nem a juíz do meu divórcio que ameaçou declarar-se incompetente para declarar um divórcio, é o belo país!)

Carochinha disse...

É mesmo uma pena termos pessoas como a Helena afastadas da política! :(
Ter em mãos um espólio com o qual podemos fazer dinheiro para sempre ou vendê-lo e ficar sem ele para sempre parece-me tão elementar... Não percebo o que vai na cabeça de quem nos governa!

Ältere Leute disse...

Estamos no auge da decadência, a resvalar para tudo o mais que aparecer de iníquo !

Anónimo disse...

Resposta ao comentarista Paulo Abreu: Quando diz "linguagem de merceeiro" está a desprestigiar a classe. Mas olhe que, sendo feita por pequenos comerciantes, é e foi composta por gente tipo "self-made man". Ou estaria a pensar no Alexandre Soares dos Santos?...)

patricio branco disse...

se tinham 85 mirós, devem, terão de ter, colecções importantes doutros pintores.
que mais aparecerá, mas quando já está em londres...
comportamento talibanico, arte não a querenmos, queremos o dinheirinho, mas para que servirá esse dinheiro? para melhorar muiseus? para reforçar as urgencias hospitalares? para reduzir o defice das universidades? aumebnntar o numero de bolsas cientificas ou humanisticas? para nada disso, claro. será mais uma gota a anotar no lado das receitas.
e dizer que ouvi um secretario de estado desconhecido, nunca o tinha visto, emprestaram lhe um gabinete na presidencia do conselho, que o ouvi como que ameaçar que se não se vendessem os mirós poderia cair sobre os portugueses mais austeridade, assim algo velado, sim, pareceu-me, etc etc

Anónimo disse...

Em Portugal todas as questões são divididas em esquerda/direita porque, como existe um atávico analfabetismo relativo às artes, os portuguesas não têm opiniões fundamentadas nem capacidade de argumentação. Guiam-se pela esquerda/direita e pronto já está.

Se há cerca de 20 anos ouvimos chamar 'calhaus' às gravuras de Foz Côa, o mais importante Museu de Arte Rupestre ao ar livre de todo o mundo, classificado como Património Cultural da Humanidade, neste caso já vi comentários que diziam das obras de Miró, que são 'rabiscos que eu tb sou capaz de fazer'. Confesso que não esperava que ainda se pudesse pensar assim... é muita iliteracia e atraso.

Por outro lado, quando se fazem contas são logo 'contas de merceeiro' que nem sei bem o que quer dizer. As contas ou estão bem feitas ou não estão bem feitas.

Quando em Portugal o que está em causa é o universo artístico e cultural, que deveria ser visto na sua globalidade e não ser sempre tudo discutido pontualmente, em avulso. Quantas obras, monumentos, custos de formação, precisam de cuidados em Portugal?

Na verdade, os comentários em geral, mostram que se pensa que os Mirós são nossos, quando estavam penhorados no BPN e existe um custo de 35 milhões de euros que terão de ser metidos no buraco BPN e que serão suportados pelos contribuintes.

Não podemos ver tudo só de um ponto de vista economicista, mas a cultura tem de ter tb uma gestão económica. A questão como sempre está em quem vai pagar os 35 milhões, continuam a ser os pensionistas?

Porque não recorrer a uma Fundação, mas das reais, quer dizer as que têm fundos próprios, porque as outras, aquelas a quem são atribuídos subsídios, não passam de 'tachos' e 'fachada'.
O problema é esse- os 'tachos' e 'fachadas' e o buraco sem fundo do BPN.




P?ôr do Sol disse...

Passos Coelho deveria explicar nos o porquê da urgencia na venda.
Qual o "negocio" que terá em vista? Terá interesse para o País? Ou será mais uma habilidade?

Estamos fartos!

Anónimo disse...

Sou TOTALMENTE contra a venda da colecção do Miró, mas já se espera tudo destes políticos que são uns autênticos "patos bravos".

Concordo que é melhor averiguar a autenticidade das obras, não vá o Oliveira e Costa ter-se dedicado à falsificação das obras enquanto andou fugido no bunker! :)

Isabel BP