quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

As letras e os números



"A minha estreita relação com as palavras vem de muito cedo. Com seis meses comecei a falar, pregando um valente susto à minha mãe. Fui também precoce na aprendizagem da leitura. Não guardo memória de alguém me ensinar a ler ou escrever (só podem ter sido os meus pais, mas não me recordo) mas lembro-me de que, quando entrei para a escola infantil, com 4 anos, já o sabia fazer com facilidade. Ler era para mim uma coisa muito intuitiva, tenho ideia de que não precisava que me ensinassem para que eu conseguisse perceber os sons e os significados associados às palavras."

Este belo excerto pertence a um post colocado em umjeitomanso.blogspot.com, e chamou a minha atenção porque é o retrato do que me lembro de ter sentido em criança. Porém, o tempo passou e para contrariar o meu Pai, que me destinava ao Direito, como ele próprio e o meu irmão mais velho, decidi que as matemáticas é que seriam o meu caminho. E foram, realmente. Apesar de só já na Universidade me ter libertado do medo que elas me causavam. Medo que fora a consequência de uma má professora que tivera no liceu e que um assistente, com muita paciência, me ensinou a vencer, tornando-me uma das melhores alunas em Cálculo e Álgebra.
Hoje consigo, finalmente, conciliar as duas vias. Escrevo e tenho na econometria a minha área preferida das questões económicas. Mas acredito que teria feito bom caminho, se tivesse seguido a profissão que o meu Pai sabiamente me destinava e era a sua...

HSC

15 comentários:

Um Jeito Manso disse...

Helena,

Que engraçado ver-me aqui no seu Fio de Prumo e que engraçado esta descrição também se aplicar a si.

Mas o engraçado é também que o resto do que a Helena diz tambéem se aplica a mim. A minha formação e a minha área profissional também giram à volta dos números.

Aliás, lá no Um Jeito Manso já escrevi algumas vezes sobre a beleza da matemática e sobre as parecenças que vejo entre a matemática e a poesia, na pureza da expressão, no rigor da escolha das palavras.

As palavras e os números, quando são amados (como nós os sabemos amar), andam lindamente a par e passo.

Um beijinho e o meu agradecimento.

José Rodrigues Dias disse...

É curioso!
Perdoem-me, mas também eu, com uma vida de números puros, às vezes duros, estou a "passar-me" agora para a poesia, procurando as palavras...
J. Rodrigues Dias

Unknown disse...

Pois é Drª Helena, na matemática, mais do que em qualquer outra matéria, é fundamental ter bons professores e estes não são necessariamente os que são melhores tecnicamente. Também eu detestava matemática no meu 4º ano liceal, por ter uma professora que apenas "despejava" exercícios no quadro, tendo a turma quase toda notas negativas no final do ano. No ano seguinte aconteceu o contrário. Os mesmos exercícios explicados por uma boa professora passaram a ser facílimos e comecei a ter na matemática uma verdadeira paixão. Será que não é este o verdadeiro problema do ensino da matemática em Portugal??

ERA UMA VEZ disse...

Olá minhas senhoras!

Posso entrar?
Posso juntar-me a este grupinho que faz os seus dias entre as palavras e os números?
(Ah ah, já cá estou)

Ai, a Cartilha de João de Deus... Foi mesmo por aí que aprendi a ler aos cinco anos com a ajuda do meu pai que por acaso não tinha grande paciência. A verdade é que quando era suposto entrar para a primeira classe, a professora colocou-me na segunda.

No Liceu, o Português sempre me correu muito bem. Já na Matemática, apanhei-lhe tal medo, que no terceiro período respirava de alívio, pois finalmente chegava a Geometria com a qual me entendia razoavelmente bem.

Como era preciso começar a trabalhar cedo, entrei para o Banco aos vinte anos e lá fiquei mais trinta e cinco. Foi o meu Ofício. Nunca foi a minha Arte, mas cumpri melhor do que esperava. Nunca teria escolhido ser bancária mas encontrei forma de ser feliz na profissão que me ajudou a educar os filhos e a permitir que façam hoje aquilo para "que nasceram". Orgulho-me disso.

A paixão pelas palavras levou-me a escrever sempre "nos intervalos" a publicar,a ler poesia em público,a fazer rádio, enfim...

E assim, minhas amigas, a Net nos vai juntando e nos vamos tocando em caminhos que a nossa Jeitinho Manso tão bem recorda...

As Crónicas Femininas,a Colecção Cinema, as Brigittes, as românticas Corin Tellado,a Condessa de Ségur, os Clássicos e, para mim... que vivia numa vila, a alegria de ver parar à minha porta a carrinha cinzenta "plissada", que chegava da Gulubenkian carregadinha de livros para devorar...

Números e letras...palavras e memórias.
Este é o nosso tempo...
Dois abraços.

Helena Sacadura Cabral disse...

Que lindos textos estes.
A ERA UMA VEZ tem poesia lindíssima e devia publica.
O JEITO MANSO é colírio para os olhos de texto e fotografia. E no GINJAL, de música também!

José e João como vos entendo.

ERA UMA VEZ disse...

Só uma curiosidade:
Para que não sabe, aí vai.
A Crónica Feminina que toda a gente esperava ansiosamente à quinta- feira, era dirigida por uma senhora de seu nome Maria Carlota Álvares da Guerra, mãe da grande actriz Maria do Céu Guerra e avó da também grande actriz Rita Lello.

(A referida revista falava de muitos assuntos, de moda a culinária, de assuntos de família, a utilidades e até a pequenos contos e entrevistas)

Espero não ter errado em nenhum dos nomes.
Há famílias assim.

Anónimo disse...

Um excelente Blogue, "Um Jeito Manso". E esse Post, que aqui refere é um deleite. Quanto à Matemática, de que eu próprio fui um bom aluno (e de tanto gostava e gosto) e que mui respeito, acabei, em virtude de uns menos capazes professores da matéria à época, gente tirana, por vir a optar por outra via: o Direito. Aquilo que, na altura gostaria de ter seguido era Medicina (o que implicava mais Matemática no, então, 6º e 7º ano do Liceu - um palavra banida entretanto!), mas por razões diferentes acabei seguindo outra carreira profissional.
Hoje, não estou arrependido. Mas mantenho o maior respeito e gosto pela Matemática. E pelo Direito. E sempre, pela leitura de um bom livro.
Um bom fim de semana!
P.Rufino

Helena Sacadura Cabral disse...

ERA UMA VEZ
Que engraçado! A Maria do Céu que conheço e estimo ser filha da directora da Crónica Feminina na~pode deixar de me fazer sorrir porque a Céu, mulher de esquerda deve ter hoje uma imensa ternura pela obra da Mãe.

Meu caro P. Rufino
Também eu tinha querido ser médica ou escultora. Doida varrida porque só tirar sangue me incomoda.
Meu Pai disse-me logo que filha dele não olhava para corpos nus.
Meu querido e tardio Pai, mal ele sabia como o mudo iria evoluir.
Agora corpos tapados é que é uma raridade. Felizmente que me salva a idade e o bom senso...

Ältere Leute disse...

Que bom ter tido um professor que lhe resgatou a Matemática! Eu não tive. Talvez não tivesse sido professora de línguas. Ou teria tido dificuldade em decidir-me entre Letras e Ciências... Mas afinal senti-me profissionalmente tão realizada !
Ah a Crónica Feminina! Publicaram-me um conto! Havia uma experiência pessoal em fundo, jeitinho para escrever e as espantosas lições de Teoria da Literatura de David Mourão-Ferreira. Mas o meu talento foi-se aos 18, 19 anos!

Um Jeito Manso disse...

Helena,

Que bela e animada tertúlia se juntou aqui em torno das letras, dos números, dos livros, das recordações.

Livros há que se chamam 'Mulheres que lêem vivem perigosamente' ou, o que lhe sucedeu, 'Mulheres que escrevem, vivem perigosamente' mas são perigos aliciantes (de resto, equivalentes aos dos homens). Ler e escrever é um prazer e que se danem os perigos.

Gostei de ver que a Amiga Era-uma-Vez, se levantou e com a sua prodigiosa capacidade de improviso e, em tom de contagiante alegria, nos recordou a sua infância também povoada de leituras.

Também não sabia da genealogia da Maria do Céu Guerra (e, por decorrência, da Rita Lello) - que engraçado, também não fazia ideia. E agora ainda me enternece mais a lembrança da Crónica Feminina.

E fiquei contente por saber que, tendo a vida levado cada um para caminhos diversos, uns por influência familiar, outros por circunstâncias do percurso escolar ou outras), nos encontramos aqui todos em sua casa, Helena, cavaqueando, neste sempre tão agradável ambiente.

Bem haja, por transmitir tão bem este tom de acolhedora hospitalidade.

ERA UMA VEZ disse...

Cara Helena

Se me permitir, gostaria de dizer à comentadora"Altere", recém chegada a esta inesperada tertúlia, que o talento não morre aos 18 ou 19 anos.

Pode hibernar durante meses, anos...mas está lá à espera que se lembre dele.
É como andar de bicicleta...

E quando Deus nos dá um dom temos de lhe dar bom uso.
Vá lá não tenha medo...
Acredite que vai surpreender-se.

Isabel Seixas disse...

Este post é tão interessante do ponto de vista da rememoração vocacional, que nos deixa viajar sobre o que poderiamos eventualmente ter sido com saudade.

Pôr do Sol disse...

É por estas e muitas outras coisas que aqui venho todos os dias e que gosto tanto deste blogue.

Fui leitora da Cronica Feminina e era grande admiradora de Mª.Carlota Alvares da Guerra, dela ainda guardo todos os seus livros que daqui a uns anos espero que a minha neta leia e goste tanto como eu.(vai ser dificil dada a distancia que nos medeia, mas algo irá ficar).

E que curioso Mª. do Ceu Guerra ser sua filha!..

Os seus livros ajudaram a formar a personalidade e os gostos de muita jovem daquele tempo.

Não me envergonho de dizer que lia a cronica feminina que pouco tinha a ver com as revistas do genero que se publicam hoje.

A unica vez que fui chamada à Directora(era gravissimo) da escola onde me formei,Escola Lusitania Feminina, que já não existe, foi por me ter caído de entre os dossiers a dita revista no meio do átrio da escola.
Eram outros os tempos.

Helena Sacadura Cabral disse...

Jeitinho
Um amigo ofereceu-me os dois livros de que fala!

Um Jeito Manso disse...

Cara Helena,

No outro dia deixei aqui um comentário mas como já tinha 'desligado' a minha conta, foi para o espaço. Isto tem destas coisas. Só depois é que percebi.

Escrevo de novo e nem é nada de especial, é apenas para referir que achei piada a issi e que tomara que goste. Foram leituras minhas de há tantos anos que, provavelmente hoje, não produziriam em mim o efeito que produziram na altura.

Contudo, a boa literatura é intemporal.

Boas leituras, boas escritas, boas gargalhadas, Helena!